5.10.06

Melodias distantes

A frente de uma paisagem desolada e amarelada, duas moças com traços eslavos e roupas não muito comuns. Ambas estão sentadas em um veículo totalmente desprovido das tradicionais curvas presentes nos modernos modelos ocidentais. Na placa do carro lê-se a sigla RUS, que pode ajudar a desvendar a origem da fotografia.
A imagem descrita é a capa de "Gulag Orkestar", nome do primeiro álbum do Beirut, projeto executado por um jovem norte-americano de 20 anos chamado Zach Condon e produzido por Jeremy Barnes, ex-Neutral Milk Hotel. E a arte desse disco tem muito a ver com o som que, pelas mãos do menino prodígio por trás do disco, que cuida das guitarras, trompetes, ukulelês, acordões etc, traz para o indie rock muitos elementos musicais do leste europeu , garantindo um ar "estranho" ao disco e catapultando-o para longe do rock independente atual, saturado de bandas influenciadas pelo pós-punk.



Capa de "Gulag Orkestar", primeiro álbum do Beirut.


E nessa mesma linha temos ainda o DeVotchKa, outra banda norte-americana que mescla indie rock com estilos estranhos, como musica cigana ou de mariachis mexicanos, resultando em canções altamente melancólicas e com harmonias bem originais.
Não acredito, no entanto, que alguma dessas tenha, efetivamente, ido a fundo nesses estilos musicais tão estranhos ao ocidente. Na realidade, parece mais que o rock está tão saturado de velhas formas, derivada sempre de meia dúzia de artistas consagrados há 30 ou 40 anos, que mesmo um garoto norte-americano, munido de uma conexão de Internet - a maior parte da divulgação do álbum do Beirut ocorreu antes mesmo de seu lançamento -, uma pilha de instrumentos e alguma influência minimamente excêntrica é capaz de dar ao ouvinte algo absolutamente diferente da grande maioria do que está sendo produzido por seus contemporâneos.
E até, quem sabe, essa falsa sensação de estar ouvindo canções criadas genuinamente por esses "povos" aparentemente tão distantes.

Onde ouvir:

DeVotchKa - http://www.myspace.com/devotchkamusic
Beirut - http://www.myspace.com/beruit

4.9.06

Bob Dylan, Girl Talk e os tempos modernos

Há alguns poucos anos um produtor que atende pelo nome artístico de Freelance Hellraiser estourou na Internet com “Stroke of a Genie-us”, um inusitado mash-up (espécie de “mistura” entre músicas, criando uma nova canção) dos Strokes com Christina Aguilera. Desde então a moda - que já estava sendo propagada pelo 2Many DJs - pegou e vários outros mash ups foram feitos.

No entanto, passada a novidade, não há como negar que a fórmula é um tanto quanto enjoativa. Algumas vezes é, inclusive, absolutamente angustiante ouvir, por exemplo, John Lennon cantando “A Day in the Life” por cima da harmonia de “Karma Police”, quando você quer ouvir uma ou outra canção se desenvolver.

Contudo, um lançamento recente mudou um pouco as coisas. “Night Ripper”, do Girl Talk, também é uma coleção de mash-ups. No entanto, ao invés de promover o simples encontro entre uns poucos artistas, o jovem de 24 anos por trás do projeto utilizou, no disco, cerca de 200 samples (pedacinhos de música), todos costurados com uma precisão invejável, lembrando mais o belo “Since I Left You”, dos Avalaches, do que qualquer outro mash-up tradicional. Dá pra ficar horas ouvindo as dançantes faixas do disco e procurando citações musicais que vão de Pixies a Nirvana, passando por Black Eye Peas, Pavement, Elton John etc.

Além de tudo, a enorme gama de referências é costurada com uma inteligência ímpar. Basta ouvir a faixa “Peak Out” e constatar um irônico dueto entre “We Want Some Pussy”, do 2 Live Crew, e “Silly Love Songs”, de Paul McCartney.




DJ Gregg Gillis, o sujeito por trás do Girl Talk

Talvez o álbum seja uma das mais evidentes provas de que o pop vive da auto-referência, com o novo surgindo de uma reciclagem do velho e tudo mais. Aí que entra Bob Dylan, mostrando que não é preciso a modernidade de um mash-up para essa óbvia constatação.

Em seu novo disco, ironicamente batizado de “Modern Times”, o compositor revisita a gênese do rock’n’roll, em um disco permeado de blues, rockabilly, toques jazzísticos e seu tradicional folk. E desde o início de sua carreia Bob Dylan sempre deixou claro que a modernidade surge, justamente, dessa visita ao passado e a utilização de suas referências – basta saber que muitas de suas composições são recriações de canções tradicionais.

Fica evidente então, seja com o “tradicionalismo” de um Bob Dylan, seja com os recursos modernos de um Girl Talk, que a música pop não precisa se desvencilhar se seu passado enquanto estiver nas mãos de sujeitos capazes.

BÔNUS:

Faça aqui o download de "Modern Times", o novo disco de Bob Dylan.

23.7.06

Black Francis? Não, Frank Black

Todo mundo que conhece os Pixies sabe quem é Black Francis. Aquele sujeito gordinho que liderou uma das bandas mais interessantes do rock alternativo, misturando imagens bizarras, letras em espanhol, barulheira e melodias, criando um estilo que influenciou incontáveis bandas na década de 90 (como Nirvana e Radiohead, só para ficar nas mais bem sucedidas).

Após o fim dos Pixies, Frank Black (e não mais Black Francis) seguiu numa carreira solo irregular junto com seus Catholics, tendo que agüentar o sucesso momentâneo de sua ex-parceira de banda Kim Deal junto das Breeders. Mas anos depois, quando nem as Breeders estavam mais no mapa da música pop, os Pixies retornaram numa bem sucedida turnê mundial, deixando todos os fãs a espera de um disco novo.


No entanto, até agora o disco não saiu. Felizmente, isso não impediu Frank Black de continuar com sua carreira solo que, após tantos anos, atingiu uma maturidade que o permitiu criar dois álbuns fantásticos: “Honeycomb” (de 2005) e o recém lançado “Fast Man, Raider Man”, ambos gravados em sessões curtas nos intervalos da turnê com os Pixies.

Nesses lançamentos, ao invés de tentar emular a fúria dos Pixies, Frank Black aceita o peso dos anos e opta por canções com os pés fincados no country e no folk. E para fazer um serviço bem feito, foram convocados diversos músicos veteranos de Nashville para a gravação. Sujeitos que, nos anos 60, criaram o que se convencionou chamar de folk-rock e country-rock. Basta dizer que muitos dos discos clássicos de Bob Dylan foram gravados exatamente da mesma forma e com os mesmos tipos de músicos.

O resultado é o melhor possível, com canções maduras, construídas com belíssimos arranjos e encharcadas de melancolia, sendo a prova cabal que Frank Black é mais do que um gordinho que adora (adorava?) berrar.

MP3s:

Strange Goodbye ("Honeycomb")
Fitzgerald ("Fast Man, Raider Man")

27.6.06

Disquinhos preferidos: Telepatas, The Streets e Primal Scream

Em época de Copa só dá tempo de ouvir discos curtos... Então cá está uma pequena seleção de singles ou EPs interessantes que caíram na minha mão nos últimos tempos.

Vegas Special – Os Telepatas: último EP da melhor banda brasileira independente na humilde opinião deste pretenso colunista. Sem abandonar o estilo “quase-rock” que tanto marca o estilo do grupo, a canção título ainda é dançante e cheia de fraseados musicais grudentos. Pode ser ouvida na Trama Virtual.

The Streets – When You Wasn't Famous (prof. Green mix): single do novo disco do rapper ingles Mike Skinner, a canção carrega o mesmo estilo esperto já apresentado nos albums anteriores. Os versos são irônicos e certeiros: “When you're a famous boy/It gets really easy to get girls/it's all so easy you get a bit spoilt/So when you try to pull a girl/Who is also famous too/It feels just like when you wasn't famous”.

Primal Scream – Country Girl: single do ultimo disco da banda, o Riot City Blues. Assim como o álbum, essa canção deixa de lado a barulheira moderna e as incursões dançantes que tanto marcaram a carreira da banda em prol de uma visita ao blues e rock de garagem.

8.5.06

Você não sentiria a minha falta?

Eu quero uma camiseta do Luna, mas não por razões puramente estéticas. O motivo principal é o trailer do documentário "Tell Me Do You Miss Me" (disponível aqui), dirigido por Matthew Buzzell e que retrata a turnê final da banda.

Pelo trailer, o documentário suscita aquelas velhas histórias de como uma banda sobrevive por 12 anos mantendo amizade, como elas devem acabar com dignidade etc. Mas, um trecho especial chama muita atenção: Dean Wareham, o ex-Galaxie 500 que liderava o Luna, afirma que se o último álbum vender 10.000 cópias, ele será o maior sucesso da banda. Só que, para uma gravadora grande, o número é ridículo. Na mesma linha, o guitarrista Sean Eden diz que as turnês da banda não davam dinheiro, e só serviam para bancar os próprios shows. Como a banda ganhava dinheiro? Vendendo camisetas. Sim, uma das bandas alternativas mais interessetantes do universo, capitaneada por um dos sujeitos mais influentes do pós-punk ganhava dinheiro vendendo camisetas.

Não que isso seja lá uma grande novidade. Só para ficarmos um dois exemplos básicos, o líder do Mudhoney, Mark Arm, trabalha na Sub Pop e Clint Conley, guitarrista do Mission of Burma, é um mero vendedor.

Mas, além daquele evidente romantismo nesse tipo de atitude - o qual muitas vezes se fundamenta no simples fato do mercado não se interessar por bandas que tem um "algo mais" a oferecer -, muito me admira o modo como eles encaram isso. Ao invés de buscarem freneticamente o sucesso, tentarem se lançar para a molecada, gravarem um single imbecil e certeiro, esses artistas simplesmente se colocam em seus devidos lugares e continuam, simplesmente, fazendo boa música.

Não que não haja nada de interessante no mainstream, muito pelo contrário. Mas ainda acho que, longe das bandas que abaixam as cabeças para suas gravadoras, há um pouco mais de liberdade e, conseqüentemente, música de qualidade.

3.5.06

Download: Radiohead novo

No último 1° de maio, Thom Yorke e Jonny Greenwood, as duas peças chave do Radiohead, tocaram no Big Ask benefit, concerto em protesto contra as mudanças climáticas. No show, que ocorreu no KOKO, em Londres, a dupla deu uma prévia de canções novas, como Arpeggi, Bodysnatchers e Cymbal Rush, todas disponíveis aqui para donwload!
Trechos em vídeo do show ainda estão disponíveis aqui.

28.4.06

Pearl Jam - novo disco

Esqueça o Eddie Vedder fanfarrão e bonachão dos shows no Brasil. O disco novo do Pearl Jam, a ser lançado oficialmente no próximo dia 02 de maio, faz sangrar o lado panfletário de um vocalista/letrista que se perdeu em lugares comuns e brados anti-belicistas bobos e pueris, que seriam relevados se esse fosse um lançamento do System of a Down.

O novo trabalho, o primeiro fora do selo Epic, cheira mofo mesmo antes de ser lançado, insinuando ser um mero retalho de letras e canções mal aproveitadas no último álbum, "Riot Act", de 2002. O hiato de mais de 3 anos desde o último lançamento é suprimido pela temática das letras, que, em sua grande maioria (7 das 13 músicas) tratam de guerra, Bush, soldados e falta de amor no mundo. O que faz pensar que Vedder escreveu mais de 100 canções na época dos atentados de 11 de setembro e apenas descansou nos últimos anos (aliás, jogue no lixo resenhas como a publicada no site da Rádio "Rock" 89 e do Terra, que dizem que o letrista deixou de lado a temática política das canções no novo disco - confira aqui e aqui).

Abrindo com "Life Wasted", cuja introdução remete inevitavelmente a "Search And Destroy" do Stooges, a hemoptise de alusões ao Iraque, Afeganistão, Irã e Palestina é notável e chata. Já a segunda faixa e single de lançamento, "World Wide Suicide", trás diversas alusões ao tema, como "It's a shame to awake in a world of pain/What does it mean when a war has taken over" e "Medals on a wooden mantle/Next to a handsome face/That the president took for granted/Writing checks that others pay". A panfletagem prossegue em "Marker in the Sand" ("Now you got both sides claiming killing in god's name/But god is nowhere to be found, conveniently"), "Gone" ("No more upset mornings/No more trying evenings/It's the American Dream I am disbelieving") e, ainda, em "Army Reserve" ("She can feel this/War on her face/Stars on her pillow/She's folding in darkness/Begging for slumber"). Nem a bela "Parachutes" escapa da tropega ânsia pacifista de Vedder ("Wish the world could go again with love/One can't seem to have enough")

O discurso embolorado ainda dá lugar a uma canção "homenagem" ao proletariado (!!!), bem à moda Bruce Sprigsteen, em Unemployable ("Well his wife and kids' asleep but he's still awake/On his brain weighs the curse of thirty bills unpaid"), que também faz lembrar o andamento de diversas músicas do último disco.

Mas, em meio à enxurrada política do vocalista, duas belas canções conseguem emergir e se destacar pela singeleza das harmonias e sutileza poética das letras. É o caso de Come Back ("Every night I'm waiting for/The real possibility that I may meet you in my dreams/Sometimes you're there and you're talking back to me/Come the morning I could swear you're next to me") e Inside Job ("Underneath this smile lies everything/All my hopes and anger, pride and shame"), não coincidentemente as duas últimas faixas do disco.

Musicalmente, o disco remete aos discos com pegadas mais "punk-rock", como "Vitalogy", momentos de "No Code" e "Binaural" e às experimentações iniciadas em Riot Act, com exceção das citadas canções finais, melancólicas e dramáticas, numa levada em que Vedder é mestre.

Resta esperar que alguém cutuque o gênio por trás desses discursos tolos e mal-elaborados, para que Vedder interrompa sua "BONOficação" desastrosa e o Pearl Jam não acabe virado uma mistura insossa e desagradável de U2 e Rage Against the Machine.

23.4.06

disquinhos preferidos: Isobel & Mark Lanegan, Ryan Adams e Serge Gainsbourg

ballad of broken seas 29 comic strip

Ballad of the Broken Seas (Mark Lanegan & Isobel Campbell): Numa parceria um tanto quanto imprevisível, Mark Lanegan (ex-Screaming Tree/Queens of the Stone Age) se juntou com Isobel Campbell (ex-Belle and Sebastian) para a gravação de “Ballad of the Broken Seas”. O contraste da voz suave de Isobel e da rouca de Mark proporciona duetos fantásticos, construídos sobre harmonias que remetem ao melhor do blues e folk americano da primeira metade do século XX. O álbum soa como uma versão mais moderna e atormentada de outras duplas, como Nancy Sinatra e Lee Hazelwood ou Jonnhy Cash e June Carter.

Extra: Clique aqui para baixar esse disco!

29 (Ryan Adams): no último disco da tríade lançada em 2005 (os outros foram “Cold Roses” e “Jacksonville City Nights”), Ryan dispensou sua banda de apoio, os Cardinals e gravou canções minimalistas, baseadas em piano e instrumentos acústicos. É o mais irregular dos três discos, mas algumas canções são espetaculares, como a linda “Carolina Rain”, narrativa que acena para a fase mais country do cantor, ou “The Sadness”, com um arranjo com toques de flamenco e letra profundamente ressentida (“The sadness is mine/Its why you're not helping me”)

Comic Strip (Serge Gainsbourg): coletânea de sucessos do mais famoso cantor e compositor francês, o controverso e engraçadíssimo Serge Gainsbourg. Esquecendo a trilha sonora de motel “Je t’aime... Moi non plus”, dá pra perceber em canções como “Bonnie and Clyde”, “Ford Mustang” e “Un poison violent, c’est ça l’amour” a força da influência de Serge em artistas contemporâneos, como Luna (que gravou “Bonnie and Clyde”) ou Portishead (que já sampleou Serge).

14.4.06

O "retorno" d'Os Mutantes

O Pitchfork Music Festival, um festival americano especializado em música independente, anunciou com orgulho um dos dos "deuses da Tropicália": Os Mutantes. Como muitos devem saber, desde que o ex-Talking Heads David Byrne resolveu lançar a coletânea "Everything is Possible", Os Mutantes ganharam um status cult na América. Além de Byrne, o grupo atraiu a atenção de sujeitos como Kurt Cobain e Sean Lennon.
Apesar de ser muito interessante ver como os americanos perceberam a importância d'Os Mutantes - sem dúvidas, um dos grupos mais interessantes e inovadores dos anos 60 - um detalhe parece ter passado desapercebido: Rita Lee não participará dessa reunião. E qualquer pessoa que conheça o grupo sabe que, após a saída de Rita, Os Mutantes se tornaram um chatíssimo grupo de rock progressivo, perdendo o humor que tanto o diferenciou dos demais.
Fica então a dúvida se o "amor" da América pelo grupo dos irmãos Baptista não é simplesmente produto daquele hype que todos conhecemos e que transforma desconhecidos em ídolos do dia para a noite...

11.4.06

disquinhos preferidos: Belle & Sebastian, Band of Horses e Built to Spill

The Life Pursuit - Belle & Sebastian: já bem distantes do minimalismo do começo de carreira, o B&S fez o álbum mais "pra cima" de sua carreira, enchendo-o camadas de vocais, sintetizadores, órgãos e levadas dançantes. Pena que aqui no Brasil, onde temos escoceses mais escoseses que os de Glasgow, ela não é mais cool. Ao menos o resto do mundo pensa totalmente diferente...

Band of Horses - Everything All Time: a música mais linda do ano está na última faixa do primeiro álbum dessa banda de Seattle, que revisita a cartilha nirvanesca ("i know you tried/i know you're cursed/i know your best was still your worst/when hollywood was calling out your name") com os pés fincados no alt-country.

Built to Spill - You In Reverse: praticamente uma instituição do indie rock norte americano, o Built to Spill gravou seu álbum mais "acesível" até o momento. Basta ouvir "Going Against Your Mind" ou "Liar", essa a segunda música mais bonita do ano.

5.4.06

Arte bruta

Corro o risco de estar sendo reducionista demais, mas agrupo a grande maioria das bandas “relevantes” de rock hoje em dia em dois bandos. De um lado temos aqueles vestidos de preto e gravatinhas, usando lápis de olho e cantando sobre temas emotivos e totalmente lugar comum. Do outro, os moderninhos despejando rios e rios de cinismo e romantismo amargo. Mas, no meio de tudo isso, surge o Art Brut, um grupo de inglês novíssimo que despontou em 2005 como ótimo “Bang Bang Rock and Roll”,um dos melhores lançamentos do ano passado.
As letras, apesar da aparência estúpida e dos temas fúteis (como paixões platônicas, namoradas e, hmm, “inaptidão sexual”), escondem uma sagacidade e inteligência sem rivais, com letras de uma ironia sem igual desde os Smiths. Logo na abertura o vocalista Eddie Argos usa sua voz rasgada para ofender todo o glamour rocker em “Formed a Band”: “I want to be the boy/The man/Who writes the song/That makes Israel and Palestine/Get along”. E ele continua o tiroteio em “Bang Bang Rock’n’Roll”, logo após ofender os deuses do Velvet Underground: “I don't want a girl that's with the band/I just want a girl that's gonna hold my hand/No more songs about sex, drugs and rock and roll/It's boring!”.


Art Brut


E as canções de amor não deixam por menos. Na melhor faixa do disco, “Emily Kane”, Argos narra a história de um rapaz que, apesar de ter sido chutado por uma namorada há 10 anos, 9 meses, 3 semanas, 4 dias, 6 horas, 13 minutos e 5 segundos, nunca esqueceu a moça. Então, como intuito de encontrá-la, escreve uma canção de rock para que crianças em ônibus escolares cantem o nome da amada por aí. Lindo! A ironia também aparece escondida em “Good Weekend”, na qual um sujeito festeja o fato de ter arrumado uma namorada: “Got myself a brand new girlfriend/So we went to the cinema/We came home from the cinema/We went through the front door/Up the stairs/Through her bedroom door/Onto the bedroom floor/I've seen her naked twice!”.
E todas as letras estão devidamente amparadas por riffs incendiários, baixo e bateria dançantes e os vocais espetaculares de Argos, cuja fúria lembram um Johnny Rotten criado em uma escola de arte inglesa. Enfim, uma banda que, ao contrário da esmagadora maioria, não se resume a um single ou a musiquinhas românticas e cínicas.
É rock inteligente em estado bruto.

30.3.06

Peraê meu...



O Bonde do Rolê, que foi citado como banda bem interessante no post passado (sobre o Cansei de Ser Sexy), agora está, aparentemente, mais hypado que o próprio CSS lá fora! A banda é inteligente, engraçada, usa samples de uma maneira muito diferente, misturando rock e funk carioca. Mas isso é um exagero sem dimensões!

Se você não está entendendo sobre o que estou falando, então olha:

1 - A britânica "New Musical Express" publicou nota sobre a banda, indicando-a para aqueles que "amam a influência baile funk" de uma música do The Streets. Duvida? Olha aqui então. (Detalhe para a data da edição no pé da página)

2 - A Rolling Stone (sim.. a Rolling Stone) publica periodicamente uma lista dos "10 Artists to Watch", lugar já ocupado pelo Artic Monkeys. Na edição desse mês, do lado da bacana TV on the Radio está... rufem os tambores.. o Bonde do Rolê. Duvida? Então olha aqui.

Repito: nada contra o som deles, que é realmente interessante, divertido e inovador. O problema é esse exagero com uma banda que tem um punhado de músicas prontas e muito mal-produzidas.

Onde vai parar esse brutal dinamismo do exagero? As bandas acabam de surgir no cenário e já estão sendo enxovalhadas com esses endeusamentos totalmente desmerecidos. Creio não ser nada sadio esse desespero da imprensa, que, apesar de ser uma síndrome pós-Nirvana, vem atingindo dimensões patológicas atualmente.

Espere e verás o Lúcio Ribeiro iniciar sua idolatria por esse trio de Curitiba.

23.3.06

Cansei de Ser Sexy ganha o mundo



Caríssimos e caríssimas:

Voltamos à ativa com uma notícia no mínimo impactante.

De acordo com Erika Palomino, da Folha de São Paulo, a banda Cansei de Ser Sexy assinou contrato para lançamento de seu disco nos Estados Unidos com a falida gravadora Sub Pop, responsável pelo lançamento de Bleach, do Nirvana, e detentora do "passe" de bandas como Mudhoney, Built to Spill, The Constantines, entre outras trocentas.

Para quem não conhece, o Cansei de Ser Sexy é a banda foco do hype da grande mídia de São Paulo (leia-se Folha de São Paulo e MTV)há alguns anos. Com apresentações espalhafatosas de gosto duvidoso (principalmente de sua vocalista/desenhista da Triton, Lovefoxxx) e conteúdo musical de gosto mais duvidoso ainda, o CSS teve, desde seu início, a simpatia da "crítica" e dos formadores de opinião e o desprezo de grande parte do público.

Com méritos ou não, a banda, em pouco mais de 2 anos de existência conseguiu lançar música na versão nacional do seriado de Paris Hilton, incluir uma faixa no The Sims 2 brasileiro e até no Big Brother 6 e, agora, ser lançada no exterior por uma gravadora que tem um grande passado a zelar.

O sucesso interno da banda, porém, não é refletido em termos de público. Apesar da forcinha da MTV, seus videoclipes são de baixa execução e suas músicas não tocam nas rádios, com exceção dos amigos da Brasil 2000. Seu disco, lançado com estardalhaço pelo selo Trama Virtual, de Carlos Eduardo Miranda, e "brodeado" por Lúcio Ribiero e Erika Palomino (veja aqui), da Folha de São Paulo, não obteve vendas expressivas, mesmo com as aparições em festivais pelo país.

Agora, apadrinhado por Diplo, o marido de M.I.A, o CSS lança o disco e parte em turnê pelos Estados Unidos, a partir do meio do ano, com o padrinho e o trio de "funk" Bonde do Rolê, uma banda bem interessante de Curitiba, que consegue utilizar samples de clássicos do rock para fazer seu batidão (escute aqui).

Vamos ver onde isso vai parar.