14.12.05

Melhores de 2005

A música pop, desde antes de Nick Hornby e as listas de "Alta Fidelidade", vive de ciclos anuais. E todos os fins de ano chovem listinhas com os melhores lançamentos, revelações e afins. Como sou um amante dessas listas, cá está a minha. Este ano, inclusive, pude me dar o luxo de elencar os melhores shows. Então, lá vão minhas escolhas:

1. The Secret Migration (Mercury Rev): produto de uma banda madura, empenhada simplesmente em fazer boas canções. Ótimas melodias, harmonias que vão da psicodelia de bandas como Love até o folk-country de Neil Young, além de uma infinidade de imagens e metáforas geniais infestando as boas letras do grupo.

2. Funeral (Arcade Fire): tá, o disco é do ano passado, mas só no começo desse ano que ele caiu na minha mão e eu ouvi direitinho. Esquivando-se das modas desse começo de século, como a revisita à New Wave ou o rock garageiro, esse octeto canadense usa uma infinidade de influências e instrumentos para criar uma massa sonora impecável, cortada por melodias e riffs grudentos. E eles ainda tocaram no Brasil!

3. Black Sheep Boy (Okkervil River): Will Sheff, líder dessa banda norte-americana, inspirou-se na história do compositor Tim Hardin para criar um álbum com ares country, mas permeado de instrumentos diferentes, como acordeões e trompetes, e guitarras saturadas na medida certa. Destaque para as letras do álbum, como os seguintes versos da canção "For Real": "Some nights I thirst for real blood, for real knives, for real cries. And then the flash of steel from real guns in real life really fills my mind."

4. You Could Have It So Much Better (Franz Ferdinand): ao invés de seguir a fórmula do genial disco anterior, o grupo de Alex Kapranos optou por investir em outros sons. O primeiro single, "Do You Want To" trocou os riffs insanos de "Take Me Out" por ótimas batidas dançamtes. Já em "Walk Away" há a invocação dos Smiths em uma balada cheia de melancolia e ironia: "And I'm not cold, I am old/At least as old as you are".

5. Clap Your Hands Say Yeah (Clap Your Hands Say Yeah): guiada pela voz desafinadíssima de Alec Ounsworth (algo entre Bob Dylan e Gene Ween), esse grupo de Nova York faz um indie-rock cheio de qualidade e originalidade. Além do mais, esta é mais uma daquelas bandas que soube usar muito bem o boca a boca virtual e a distribuição maciça de MP3 para garantir um lugar ao Sol.

Menções honrosas: Antony & The Johnsons (baladas tristes, com ecos da fase Berlin de Lou Reed), Kaiser Chiefs (dance, motherfucker, dance), Bloc Party (mais rock dançante), Raveonettes (Buddy Holly encontrando o Jesus and Mary Chain), Ryan Adams (voltou a calçar suas botinas e lançou um monte de discos novos), José Gonzales (folk-singer que coloca o queridinho Willy Manson no chinelo), Sufjan Stevens (baladas folk dedicadas ao estado de Illinois).



Arcade Fire


Shows:

1. Mercury Rev (Curitiba Rock Festival): amparando-se no repertório do último disco, "The Secret Migration", e nos hits dos álbuns anteriores, o grupo evocou a atmosfera folk-psicodélica de estúdio de forma primorosa. Vale ainda lembrar da performance teatral de Jonathan Donahue e das imagens projetadas ao fundo da banda, que se integravam perfeitamente às canções.

2. Flaming Lips (Claro que é Rock): mesmo quem nunca tinha ouvido a banda adorou o show. Teve tudo: bolha espacial, confetes, serpentinas, ursinhos de pelúcia, bexigas e demais esquisitices providenciadas por Wayne Coyne e sua mente fritada pelos anos de consumo de drogas. E não faltaram os hits da banda, como "Do You Realize?" e "She Don’t Use Jelly", os quais foram devidamente acompanhados dos covers de uma versão karaokê de "Bohemian Rapsody" e da bélica "War Pigs", do Black Sabbath.

3. Arcade Fire (Tim Festival): a perfeita vingança dos nerds. Um bando de canadenses esquisitos que conseguiram fazer violinos e acordeões soarem mais pesados que as guitarras dos Kings of Leon. Somente Iggy Pop conseguiu rivalizar a energia e presença de palco do grupo em sua apresentação carioca.

4. Wilco (Tim Festival): solos longos à la Neil Young, baladas certeiras e uma ou outra dose de experimentalismo distribuídas em duas horas de show. Com mais de uma década de estrada, Jeff Tweedy contou com sua experiência e o amplo repertório da banda para fazer uma das melhores apresentações do ano.

5. Iggy Pop (Claro que é Rock): ele é o Iggy Pop. Ele tocou sem camisa e com o cofrinho a mostra. Ele se enfiou no meio do público, arrumou encrenca com os seguranças e com a "fuckin’ MTV". E tocou "I Wanna Be Your Dog" duas vezes. Precisa mais?

6.12.05

Vamo quebra tudo! Vamo, vamo...

O rock é revolucionário por essência. Não que Lênin e Guevara usassem guitarras, mas a origem do negócio se encontra na quebra da monotonia, na chacoalhada comportamental e estética e no balanço dos esqueletos osteoporéticos do estabelishment cultural (em suma, a porra-louquice em si mesma). Nenhuma novidade, mas parto disso para fazer um paralelo de dois rumos discordantes sustentados por bandas de grande e médio porte no Brasil.



De um lado, pesando 120 kg, 2,15 m de altura e esmagadora carreira de vitórias mercadológicas estão Skank, Jota Quest e Charlie Brown Jr., os grupos de maior vendagem no segmento pop-rock nacional. Em comum, longos anos de estrada, grande número de fãs, execução em massa nas rádios e tv´s e confortável garantia de “lançou-vendeu”.

Apesar das diversas virtudes dessas bandas, principalmente no começo de suas carreiras, o comodismo financeiro e a fórmula do sucesso acabou por transformar o negócio deles num simples Lulu Santos mais pesado, uma espécie de Bon Jovi ou U2 tropical.

O grupo de Rogério Flausino lançou recentemente uma versão de “Além do Horizonte”, um pagode-fake que Roberto Carlos infelizmente sustenta em seu repertório magnífico. A letra fala explicitamente de liberdade e fuga, mas a interpretação da banda mineira sugere no máximo uma patética conversa pós-velório-rumo-ao-enterro.

Falando em fuga, os outros mineiros do Skank assassinaram um dos maiores clássicos de Gilberto Gil para o comercial da Rider. Na visão de Samuel Rosa, “Vamos Fugir” um quase-hino da contracultura tropicalista - que contou com os Wailers em sua versão original - mais parece uma cantiga entoada pelo Missionário RR. Soares, o Edir Macedo da Igreja Internacional da Graça de Deus.

Falando em Deus, o Chorão vai fundar uma religião. Eu tenho certeza disso. Ou vai retomar o Rodox com o “falecido” Rodolfo Raimundos. Não bastasse o verso “Eu descobri que azul é a cor da parede da casa de Deus”, da música “Lugar ao Sol”, de 2001, o auto-intitulado “Marginal Alado” me aparece com “o melhor presente Deus me deu: a vida me ensinou a lutar pelo que é meu”, do disco novo. Não sou ateu, mas, meu amigo, num vá arruma briga com o Padre Marcelo. Se continuar assim, quando o Bento XVI vier pro Brasil, quem cantará a Ave-Maria não vai ser a Fafá de Belém.

No outro lado, com mirrados 54kg, 1.65 de altura e uma carreira sustentada na unha os pesos-pena Cachorro Grande e Bidê ou Balde, dois grandes expoentes das bandas de médio porte. Em comum, 3 discos lançados, terninhos anos 60, o adesivo “rock gaúcho”, a fama de banda engraçadinha-chata e o histórico de shows ensandecidos.

Os dois grupos lançaram discos esse ano pela revista Outracoisa, administrada pelo mito Lobão e os trabalhos trazem algo que remete ao primeiro parágrafo: são verdadeiras homenagens epicuristas à destruição do falso prazer decorrente do comodismo e da bunda-molice. No dialeto de Lobão, constituem real expressão da “pau-durescência” inerente ao rock.

“É preciso dar vazão aos sentimentos!”, título auto-explicativo do mais recente lançamento do Bidê ou Balde é a exortação à necessidade de se mexer. Seja para fazer uma festa, para ir a uma cachoeira, para casar (!) ou apenas para dizer “sim” uma única vez. A faixa que dá nome ao disco trás os versos: “insiste em fazer o que te dá passa na cabeça/ Costuma esquecer o que te decepcionar/ acorda e segue em frente pro que quer que lhe aconteça/ afinal de contas ta na vida pra gozar”. Dá pra notar a tônica da mensagem.

No mesmo sentido, “Pista Livre” do Cachorro Grande expressa o que o “Famílila MTV” pôde mostrar nos últimos dias. Uma banda de amigos, festeira e compromissada com a auto-satisfação. “Nada me impede de fazer o que eu afim” é o que berra Beto Bruno na frenética “Agora eu to bem Loco!”. Os gaúchos mantém, após 3 discos de relativo sucesso, a mesma mensagem “chute aquela porta” do início.

É óbvio que os dois lados são necessários para o andamento do mercado e coisa e tal e sei que a maioria dos leitores não aprecia nem um pouco as “bandas gaúchas”, mas quem se arrisca a discordar que o rock brasileiro esqueceu o eixo Rio-São Paulo pra passear um pouco lá pelos Pampas, aproveitar umas “budegas” e recuperar suas “chalaçadas” e “chinelagens” originais?

1.12.05

Chimbinha, Cansei de Ser Sexy e o mercado malvado

Até pouco tempo atrás, a Banda Calypso não era absolutamente nada no sudeste. Eu até já ouvira um amigo – amante de forró e música brega – rasgar alguns exaltados elogios à banda quando passávamos em frente de uma barraquinha de camelôs. Mas, passado mais de um ano desse dia, a Banda Calypso está estourada na mídia, com uma vendagem de discos que chegou a 5 milhões de cópias, e apresentações lotadas em casas de show nobres.
Indagado pela Folha de S. Paulo sobre o baixo preço dos oito discos da banda (R$ 10,00), Chimbinha, que divide a liderança do grupo com cantora-dançarina Joelma, dispara: “Nós mesmo fabricamos e fica mais barato do que fazer com uma gravadora. Não pagamos produtor, diretor não sei do quê, arranjador. Eu mesmo faço o arranjo, a direção, tudo. Não ganhamos muito com o CD, mas ficamos conhecidos e temos lucro com o show”. E emenda, sobre a pirataria: “(...) não brigamos com os pirateiros. Estouramos por causa da pirataria, que nos levou a várias cidades onde não chegaríamos”. Hipocrisia zero.


Joelma e Chimbinha, da Banda Calypso


E o fashion-hype Cansei de Ser Sexy adotou uma estratégia semelhante à da banda paraense. Correndo por fora da indústria fonográfica normal, alavancou a carreira a partir da distribuição gratuita de MP3s e propaganda em blogs – a versão século 21 da disseminação “boca a boca”. Gravaram então um disco oficial (com preço oficial, inclusive), mas vendem em shows uma versão alternativa do álbum, que traz um CD-R. Com ele o comprador grava uma cópia do álbum e dá (sim, de graça) para alguém.
A semelhança dos dois casos é nítida: observando o atual contexto da industria fonográfica, as duas bandas criaram alternativas viáveis para a disseminação de suas canções. Como os dois grupos encontraram bons nichos de venda, bingo!
E isso ainda serve para quebrar as pernas daqueles sujeitos que sempre reclamam da “falta de espaço para a divulgação do trabalho”. Mais do que nunca, o espaço está aberto. A questão é ser esperto como o Chimbinha.

20.10.05

O público ganha o que quer?

Desde o fim do Jesus and Mary Chain, no já longínquo ano de 1998, qualquer apresentação de um dos irmãos Reid é festejada no mundo rock alternativo. Afinal, foram esses dois sujeitos que, no mais longínquo ainda ano 1985, usaram feedback e belas melodias se tornarem uma das mais influentes bandas do pós-punk.
No último dia 13 de outubro aconteceu o Sonic Cathedral, um pequeno festival inglês dedicado à memória do célebre DJ John Peel, falecido há um ano. Dentre as atrações estava agendado um show do ex-Mary Chain Jim Reid, que acabou de lançar um single split com seu irmã, Sister Vanilla (produzido por Willian Reid, a outra metade do J&MC). Em tese, essa seria a ocasião perfeita para o sujeito tentar retomar a carreira, promover seu single e tudo mais.
Contudo, o que o público viu foi um Jim Reid bêbado e hesitante, cambelando entre algumas poucas canções – nenhuma de sua finada banda. Antes de deixar o palco, Jim tentou tirar outra canção de sua desafinada guitarra mas, vendo que não seria capaz, mandou um “i’m outta here” e deixou o palco. Por óbvio não estive no local, mas quase todas as manifestações do fórum “Some Candy Talking”, dedicado ao J&MC, descreveram esse show desastroso, que irritou até mesmo os fãs mais ardorosos.



Jim Reid: bêbado decadente ou gênio ainda incompreendido?


Entretanto, qualquer um que conheça a história da banda sabe que, quando o grupo começou, os show eram marcados justamente por algo que poderíamos chamar de “desrespeito” ao público. A banda tocava geralmente de costas para a platéia, bêbados e por cerca de meia hora, o que fazia com que boa parte dos concertos terminassem em quebra-quebra. No decorrer dos anos, a atitude mudou pouco, tanto que a banda acabou no palco, depois de uma briga entre dois embriagados irmãos Reid. E os álbuns seguiam essa lógica torta, com constantes guinadas sempre que o sucesso chegava perto. Com isso, mesmo sempre tendo chegado perto do sucesso – no primeiro disco a banda foi chamada de “novos Sex Pistols” – nunca chegaram aos mainstream.
E essa atitude lembra a de outra banda, o Brian Jonestown Massacre, cuja trajetória foi retratada no espetacular documentário Dig! (o qual vai ser exibido na 29ª Mostra Internacional de Cinema de SP). Apesar de toda a genialidade do líder-ditador Anton Newcombe, a banda nunca estourou em função de seu comportamento auto-destrutivo e anti-mainstream.
Assim, fica no ar o que eu acredito ser um dos maiores dilemas do rock: o artista deve dar ao público exatamente o que ele quer, ou deve, nos dizerem de Anton Newcombe, “keep the music evil”, fazendo o que der na telha?

13.10.05

Natal em Marte


A banda mais doida da Terra está sugerindo a você um psicodélico e nonsense "Natal em Marte". Esse é o título do filme que o Flaming Lips pretende lançar em 2006, após anos e anos na produção da película. Pelos shows da banda (que vem ao Brasil em novembro) dá pra ter uma mínima noção da insanidade que vem por aí. As perfomances ultimamente têm incluído uma fantástica bolha de plástico envolvendo Wayne Coyne, que "flutua" pela platéia dentro dela, além de utilização de instrumentos bizarros, como gongos, e gelo seco e bonequinhos (!?).



Sobre o filme, Coyne diz: "Estou pensando em levar isso para os cinemas para que seja uma experiência em que o filme seja acompanhado de um sistema de som gigante, máquinas de fumaça, luzes de Natal, merdas caindo em você do teto e você poderá fumar maconha e fazer o que desejar". O doente mental prossegue dizendo que o espetáculo deverá ser presenciado no cinema e não em casa. "O filme deverá sair em DVD e terá uma trilha sonora, mas essa não será a experiência real", diz.

Para quem não se lembra, o lunático em questão já lançou com sua banda, em 1997, o absurdo disco quádruplo "Zaireeka", onde os quatros discos teriam que ser ouvidos ao mesmo tempo para que a música "fizesse sentido". A versão "juntada" do disco pode ser encontrada no Soulseek, mas os fãs mais afoitos dizem não ser a mesma coisa.

Loucuras a parte, a banda tem um arsenal muito potente de belas canções, como "She Don´t Use Jelly" e "Turn it on", do fantástico e demente (óbvio!) "Transmissions from the Satellite Heart", de 1993, e "Do you realize?" e "Fight Test", do último e melhor disco "Yoshimi Battles tje Pink Robots".

Por todas essas razões, o show no Brasil deverá ser, no mínimo, uma experiência única. Mas como diz o próprio Coyne em "Fight Test": é tudo um mistério!

Fonte sobre o filme: NME.com

3.10.05

The gift of sound and vision

Não eram só cinco sujeitos tocando canções pop, daqueles que empolgam por duas horas e só – não que isso já não seja o suficiente para um show ser algo fenomenal. O que o Mercury Rev proporcionou ao fechar a última noite do Curitiba Rock Festival está além disso. Algo que não pode ser digerido em duas horas a frente de um palco.
O primeiro detalhe que diferenciou a apresentação das demais foi um telão armado atrás da banda, no qual foram projetadas diversas imagens e citações durante todo o espetáculo, no melhor estilo do Pink Floyd da era do Syd Barrett ou os Velvets quanto eram os queridinhos de Andy Warhol. Antes da banda subir ao palco foram projetadas diversas capas de álbuns, livros e filmes que, de uma forma ou de outra, influenciaram a banda: estavam lá desde o jazz vanguardista de Coltrane, Coleman e Sun Ra até o pós-punk dos Replacements, Hüsker Dü e Galaxie 500, passando ainda por Bob Dylan, Leonard Cohen, Kerouac, Chemical Brothers etc.
Terminadas as projeções iniciais a banda sobe ao palco, com o vocalista Donahue empunhando meia garrafa de vinho tinto. Abrem o show com “Secret for a Song” a primeira faixa do último álbum, “The Secret Migration”. Pelo resto do concerto o grupo iria tocar praticamente todas as faixas do disco, com destaque para a climática “My Love” e a empolgante “Vermillion”.


Palco do show do Mercury Rev: sincronia entre sons e imagens.


Um dos pontos altos do show foi a execução de “Tonite It Shows”: o guitarrista Grasshoper, que trocou um pouco sua Stratocaster por uma gaita de boca, e o baixista, que trocou seu instrumento por um piano elétrico, criaram o cenário perfeito para que o performático Jonathan Donahue cantasse e gesticulasse os belos versos da canção. E algo semelhante ocorreu no número final, “The Dark is Rising”, com o lunático líder da banda comandando explosões sonoras de uma orquestra imaginária.
E durante todo o espetáculo as projeções continuaram. Citações de artistas, filósofos e até mesmo o Mestre Yoda ou do E.T. eram alternadas com palavras de ordem, algumas beirando perigosamente a auto-ajuda, além de pedaços de filmes e imagens aleatórias. Tudo era tão bem costurado que, apesar de chegarem perto de merecerem o título de pedantes ou de hippies, a dignidade foi mantida intacta.
No conjunto da obra, a climática música da banda, que consegui reproduzir a grandiosidade das gravações de estúdio, acabava se integrando perfeitamente às imagens e à performance de Donahue, ficando claro que tudo não era apenas um show de rock.

30.9.05

O barulhento som do amor

Dentre as bandas que abriram a última noite do Curitiba Rock Festival, poucos destaques. Os Móveis Coloniais de Acajú animaram parte do público com seus metais e a empolgação de seus membros. Los Diaños também atraíram atenção com seu punk movido a contra-baixo acústico, trumpete e guitarra distorcida. E o Ultramen, por ter um bom número de fãs, também chamou atenção, apesar da banda parecer um Rappa mal ajambrado.
De resto, sobraram bandas ruins, anacrônicas ou simplesmente chatas. Patife Band mostrou que o envolvimento com a “vanguarda paulista” não serviu para nada, já que tocaram um punk rock da pior espécie. A hypada Karine Alexandrino parecia um Cansei de Ser Sexy piorado, cantarolando tortamente sobre bases eletrônicas sem graça. Um ou outro grupo que não citei deve ter sido tão pavoroso que me fez ir beber cerveja ou olhar a chuva ao invés de ficar perto do palco.
Dessas apresentações tirei as seguintes conclusões: ou as bandas brasileiras são realmente ruins, sem nenhuma inventividade, ou não foram convidadas as bandas certas, que foram preteridas diante dos queridinhos de sempre. Pouco importa qual seja a verdade, pois os dois cenários não são nada animadores.
Mas o melhor ainda estava por vir, e a noite começou mesmo quando os Raveonettes, herdeiros diretos da mistura de "barulho branco" com belas melodias criada pelo Jesus and Mary Chain, entraram no palco.


Sharin Foo, grande destaque da apresentação dos Raveonettes


A beldade Sharin Foo, vestida como uma ginasial americana em um baile da primavera, poderia fazer o público acreditar que todos estavam nos anos 50, não fossem as três guitarras - uma delas capitaneada pela outra metada de banda, o sinistro Sune Rose Wagner - que, quando não estavam disparando riffs a lá rockabilly, apitavam e enchiam o Curtiba MasterHall de feedback.
A base da apresentação foi o último disco da banda, “Pretty in Black”, que fez o público dançar em canções como a empolgante “That Great Love Sound”, o single “Love in Trashcan”, e “My Boyfriend is Back”, espetacular cover das Angels, grupo vocal dos anos 50. Mas os hits antigos não foram esquecidos, em especial “The Attack of the Ghost Riders”, um dos pontos altos do show.
Por fim, o carisma da banda merece destaque especial. Sharin Foo falou com o público o tempo todo, e parecia estar surpresa com a recepção que tiveram do público brasileiro. Ao final da apresentação fez questão de descer próximo ao público e sair apertando as mãos do pessoal.
Um amigo disse que quem nunca viu o Jesus and Mary Chain pôde se contentar com os Raveonettes. E, de fato, apesar da banda não plagiar os irmãos Reid, a microfonia desses escoceses continua tão viva quanto em 1986.

27.9.05

EXTRA EXTRA EXTRA!!!

Pra quem não foi ou pra quem quer lembrar aí vai um link com vídeo das 3 primeiras músicas do show do WEEZER!

GET THE VIDEO

Slap you on the face and enjoy the show!



Inesquecível. Isso é só um pouco do que pode ser falado da primeira (e provavelmente única) apresentação do Weezer no Brasil. Obviamente por se tratar de uma banda cheia de mistérios, o show foi precedido de um sem-número de boatos e rumores, que caíram por terra quando aqueles quatro americanos empolgados subiram ao palco.

Primeiro, um desagravo à organização do show. Se esses caras de Curitiba pretendem manter o sucesso do festival deveriam pensar seriamente em se profissionalizar. A venda de ingressos foi um desrespeito, a escalação das bandas deixou a desejar, o local do show mudou na última hora e o horário de início em São Paulo era 15 hrs e, para surpresa, em Curitiba era 19 hrs (tudo bem que deu tempo pra tomar uma cerveja ao som de Teodoro e Sampaio num buteco sertanejo – aliás, nunca vi uma cidade com tão poucos butecos por quarteirão!!).

Mas, vamos ao que interessa. Antes do Weezer tocaram algumas bandas independentes brasileiras, das mais variadas regiões do país. As duas de maior destaque foram Biônica (SP) e Acabou La Tequila (RJ).

A primeira por seu tradicional show ridículo, feito por músicas ridículas e pela postura ridícula da moça “MTV-Na Base”. Como uma banda tão ruim, em todos os aspectos, pode ser cogitada para tocar nesse e em outros festivais?

Mistérios à parte, o Acabou La Tequila entrou na seqüência com um show memorável. Tinha curiosidade de ver ao vivo a banda idolatrada por Marcelo Camelo e Rodrigo Amarante. E, de fato, os caras mandam muito bem. Dá pra notar claramente a influência deles no primeiro disco dos Hermanos. A banda é praticamente uma constelação do mundo indie: Kassin é o produtor do Los Hermanos, Nervoso é um dos mais elogiados em sua carreira solo e Gabriel Thomaz, o gênio por trás do Little Quail and The Mad Birds e do Autoramas. Puro gás!

Aí veio o Weezer. Os caras já entraram botando fogo no público com a seqüência matadora de “My name is Jonas”, “Tired of Sex” e “Don´t let go", causando catarse coletiva nos ávidos fanáticos que se estapeavam na platéia.

A empolgação da banda era absurda e a qualidade do show impressionava. Rivers realmente parece um nerdinho dos filmes da sessão da tarde, com um paletó “meu-vô-tinha” e uma cara de tonto idêntica a do Samuel Rosa. Mesmo assim se mostrou um grande condutor de platéias. Destaque também para Brian Bell com backing-vocals e vocais potentes e infalíveis e uma guitarra pesadíssima.

Depois de “This is Such a Pitty” a banda, após divertir o público, começa inacreditavelmente a tocar “Big Me”, do Foo Fighters. O público vem a baixo, acompanhando toda a letra da música. Não era o Killers alardeado pelo Lúcio Ribeiro , mas valeu pela raridade do momento.

Após “Buddy Holly e “Photograph”, essa com Rivers Cuomo na bateria e Pat Wilson no vocal e guitarra, no melhor estilo Nirvana em 93, uma pequena pausa e Rivers surge no meio da platéia VIP e toca “Island in the sun”, ovacionado pelo público, num belo momento acústico que lembrou Jack White em Manaus.

Voltando ao palco, a banda, para delírio da platéia, resolve recrutar algum fanático para tocar com eles a próxima música. O sortudo escolhido por Brian Bell mal sabia o que estava fazendo no palco, tamanha a surpresa. E a banda toca “Undone” com direito a performances de Rivers e Brian Bell junto com o garoto (que quase meteu o violão na cara do Rivers).

O show terminou potente com “Surf Wax America”, com o público emocionado e na certeza de que aquilo ali não se repetiria tão cedo.

Ao fim do show uma coisa chamou a atenção de todos: eles não tocaram NADA do Maladroit. Quem conhece a banda sabe que o esquisitão do Rivers não gosta nem um pouco do disco e isso ficou bem claro em Curitiba. Mas, tudo bem, não fez falta alguma.
PS: No site da banda eles dizem que esse show está entre os maiores de todos os tempos. Com certeza não é um exagero.

30.8.05

Eu estava certo

Geralmente tento escrever essas colunas do modo mais impessoal possível. É claro que é besteira dizer que dá para ser totalmente objetivo, mas com algum esforço é possível chegar perto.
Bom, desta vez eu quero ser pessoal só para afirmar: “eu estava certo”.
Há mais de um ano, eu e mais dois amigos nos enfiamos num evento comemorativo do Dia da Mulher. Na verdade o local era um encontro de riot grrrls (com muitos “r”), recheado de bandas com um pé no punk e outro em discursos feministas retrógrados. Só a última banda não bradou contra a dominação dos machos. Ao invés disso, meia dúzia de meninas se espremeram no palco e mandaram pouco mais de 20 minutos de músicas rápidas e sujas, com as duas vocalistas gritando e se empurrando o show todo.
Era o começo do hype ao redor do Cansei de Ser Sexy e minha defesa em favor da banda, uma das poucas da cena indie que eu achava que tinha futuro.
Mais de um ano depois assisti outro show delas. A essa altura, elas já haviam tocado no Tim Festival e estavam escaladas para o Campari Rock. Ao invés de barulheira e um teclado vagabundo daquele meu primeiro, bases programadas que tornam o show quase um playback. Ou, como disse um amigo, um circo.



A performance continuava parecida, mas, por incrível que pareça, as coisas soavam mais amadoras ainda. Lovefoxxx tentava brincar de fazer malabarismos com o microfone, mas não conseguia. Suas piadinhas eram ruins e suas dancinhas parecem ter saído de algum programa de auditório dos anos 80. Nenhuma banda de electro precisa de três guitarras fazendo os mesmos power chords. É notório que o único músico da banda é o Adriano ex-Butcher.
Mas, havia pouco daquela pose indie que tanto empesteia a maior parte das bandas do gênero. A coisa estava mais perto do Latino do que do Placebo. Mais perto do Réu e Condenado do que dos Forgotten Boys.
Termina o show e uma amiga que nunca deve ter ouvido as palavras indie ou hype na vida diz que também queria “cansar de ser sexy”.
Hype? Sim, sem dúvidas. Importa? Bom, já ouvi o Ludov sendo tocado até na rodoviário do Tietê. O Daniel Belleza jogou no Rock Gol. E outros tantos casos. Até agora não foram muito longe: não chamaram atenção de ninguém que convive em locais onde há uma real concorrência na cena musical, não conseguiram usar pose, internet, ironia, amadorismo e coisas afins de um jeito inteligente.
E nem irão. Só hype não leva ninguém muito longe.
E acredito que vou estar certo dessa vez também.

P.S.: escrevo isso antes das pretensões do CSS darem certo de verdade – coisas como lançamento de discos e turnê internacional. Senão, seria fácil demais falar “eu estava certo”.

17.8.05

Brothers and sisters, are you ready?

Acredito que quase todas as pessoas que compareceram na noite de sábado do Campari Rock esperavam ver no DKT/MC5 um simples tributo ao passado de uma das mais influentes bandas de rock da história, já que shows de “lendas vivas” costumam ser cercados mais pela importância histórica e pelos hits do que pela esperança de uma apresentação memorável.
Contudo, o DKT/MC5 frustrou todos que foram à Fábrica da Lapa com essa expectativa. Apesar do palco ter sido dominado por quatro senhores (os três membros remanescentes do MC5, mais o guitarrista convidado Marshall Crenshaw), os primeiros segundos de “Ramblin’ Rose” mostraram que o grupo não ia se limitar a um simples tributo àquele MC5 que terminou no início dos anos 70.


Wayne Kramer em apresentação com o DKT/MC5


Durante todo o espetáculo, Wayne Kramer não parou de disparar riff seguido de riff sobre o público, empunhando sua guitarra como uma das armas que ele devia usar para assaltar casas durante os anos 70. Apesar de seu comportado traje branco, do fato de ter puxado um corinho com o público durante “Rama Lama Fa Fa Fa”, ou de ter ensaiado uma esdrúxula dancinha digna do grupo “É o Tcham”, Kramer manteve uma postura rocker que poucos, mas muito poucos mesmo, conseguem ter.
E o outro protagonista da noite foi o grande Mark Arm, cuja performance ensandecida lembrava a dos tempos áureos de Iggy Pop, também contemporâneo do MC5. Faltou somente andar sobre o público durante a última música do show, quando era arrastado de um lado pelo outro – sem soltar o microfone nem parar de cantar – pelo público.
No fim do espetáculo, o mais longo do Campari Rock, ficou a nítida impressão que aqueles quatro senhores – Mark Arm ainda não está tão velho para receber esse título – agarraram-se com muita dignidade e vontade ao que talvez seja uma das últimas oportunidades deles animarem alguns filhos da mãe e lembrarem que, apesar da ferrugem, o rock não morre tão cedo.

25.7.05

É isso

Em notícia recente, o pessoal do ótimo Pitchfork Media, um dos melhores sites especializados em música alternativa, mostrou-se indignado pelo fato dos primeiros shows dos Strokes após a finalização do terceiro álbum acontecerem na “exótica” – palavras deles – América Latina. Não vou ficar aqui dizendo que os gringos são ignorantes e tudo mais, principalmente porque o textinho deles ficou bem engraçado. Acho que o ponto mais importante da notícia é outro.
Lendo a notícia, fica óbvio que os Strokes são extremamente importantes. Até mesmo o Pitchfork Media, que, talvez por ser avesso a grupos excessivamente comerciais, cometeu o sacrilégio de torcer o nariz pro Killers, reconhecem isso.



Acredito que o sucesso da banda deve-se ao fato de que, além de criar canções pop por excelência e ser totalmente hype, o líder Julian Casablancas parece cantar sobre algo que tem perfeita identidade com a geração pós-anos 90. Temas que as bandas que explodiram no começo dos anos 90 tratavam com uma sinceridade por vezes dilacerante, os Strokes tratam com um misto de futilidade e paixão fugaz. “The room is on fire/As she’s fixing her hair”, “We were just two friends in lust/and baby that just doesn’t mean much”, “I'm sick of you/And that's the way it is”...
Além de terem essa identidade com a geração que os idolatra, o grupo está gravando o terceiro álbum que, como diria o ex-Smith Johnny Marr, é aquele no qual a banda pára de tentar copiar seus ídolos e parte para algo mais original. E, ao que parece, é o caminho que os Strokes estão tomando: uma das músicas traz até um mellotron – um tecladão popular entre as bandas de rock progressivo - sendo tocando por Nick Valensi. E tudo indica que a América Latina verá essas canções ao vivo antes dos nova-iorquinos do Pitchfork Media...
Portanto, fica evidente a importância do show, especialmente para nós, brasileiros, que temos pouquíssimas oportunidades de ver uma banda tão importante em um momento tão decisivo de sua carreira.


DISQUINHOS PREFERIDOS


Okkervil Sheep – Black Sheep Boy: disco que, apesar demetido a conceitual – conta a história de Tim Hardin, um compositor dos anos 60 – é fenomenal. Melodias belas e tristes, acompanhadas por arranjos de violão, guitarras saturadas e feedback na medida certa.

Clap Your Hand Say Yeah – Clap Your Hand Say Yeah : bandinha que toca um bom e velho indie rock, cheio de boas melodias e vocais um tanto quanto desafinados. Isso sem falar no nome da banda, que é genial.

8.7.05

A necessidade do Choro

Alexandre Magno Abrão, vulgo Chorão, é aquele homem que todos amam odiar. Dono (sim, dono!) da maior banda de rock do país (ao menos em vendagens e popularidade), criador de tantas frases de efeito como confusões e brigas, seja no meio musical como em sua vida pessoal, consegue personificar em si todo o ódio e a raiva de um grande número de adoradores de música que se dizem contra as regras de mercado, as "bandas produzidas" e os letristas burros.
Fato notório que suas letras não remetem a nenhum Carlos Drummond de Andrade ou Vinícius de Moraes, principalmente no quesito gramática (aliás, tenho certeza de que poucos dos que o criticam já analisaram realmente suas letras). Óbvio, também, que sua postura não é a mais humilde e amistosa, principalmente com seus detratores. Ainda, suas melodias e harmonias não representam muita inovação em relação a dezenas de bandas de punk rock ou ska-core. Mas, mesmo assim, por que tanto sucesso? Eu tenho uma teoria.
A figura e a postura de Chorão são necessárias em qualquer cenário musical. Imaginem se todas as bandas fossem feitas de meninos barbudinhos que usam camisas da C&A e adotam a postura de gênios desleixados? Ou ainda se todas os grupos primassem por novas elocubrações melódicas e harmônicas, misturando rococó com o barroco nacionalista e pitadas de art-noveau post-surrealista? Ou ainda, se todos resumissem seu trabalho numa emulação forçada de melodias punk rock chupadas de trocentas bandas californianas e adicionassem letras típicas de cantores breganejos, só porque é "legal" ser emotivo e raivoso hoje em dia? O mundo seria um saco!
Pode-se falar que ele é babaca, folgado, chato e bobo de galochas e até burro em suas letras, mas uma coisa não dá pra negar: o rapaz é sincero e representa muito a juventude brasileira (pelo menos a grande maioria dela). Não dá pra sustentar sempre essa arrogância pequeno-burguesa de julgar a arte fora de seu contexto de criação e de direcionamento.
Seu comportamento e sua criação são absolutamente iguais a artistas como Liam Gallangher, Axl Rose e Anthony Kiedis, justamente por todos eles terem a mesma bagagem: lares destruídos, abuso de drogas, pobreza (tirando o Kiedes), falta de educação, ausência de perspectivas e por aí vai. E isso reflete em suas letras poeticamente pobres (para a maioria) e em seu estilo "não mexe comigo que eu te quebro". E, você que está lendo isso agora, vai negar que essa é a vida de 90% da juventude do nosso país? Claro que não.
E não só os "pobres-burros-alienados" (na patética visão de quem assim pensa) se envolve com esse tipo de som. A massa do pessoal mais novo da classe média alta também se identifica com esse comportamento e com essas musicas porque justamente vivem sua fase de "rebeldia sem causa" (tenho certeza que a grande maioria aqui gostava de Charlie Brown Jr. a seis ou sete anos atrás).
Assim, apesar de todos os aspectos negativos, é inegável que o rapaz tem talento, suas músicas são boas e correspondem ao objetivo a que se propõem. É bobo e frágil demais esse modismo de "eu odeio o Chorão", baseado em elitismos intelecutais cretinos e dignos de desprezo.
Uns acham Arnaldo Antunes um gênio. Eu ainda prefiro o Chorão.

13.6.05

O Brasil e a música alternativa (parte I)

Começo a coluna já partindo de uma opinião: a dita cena alternativa (ou indie) brasileira é extremamente ruim. Acho as bandas, em sua esmagadora maioria, muito fracas. Tanto que tenho quase certeza absoluta que, se confrontássemos nossa cena com a de outros países, perderíamos de lavada. Mas, para não ficar só no “achismo”, vou tentar fundamentar minha opinião nesta coluna e em outras futuras
Um dos vários problemas que vejo em nossa cena alternativa é uma certa “imposição” de brasilidade. Muitas vezes me parece que certos artistas são colocados num patamar superior simplesmente porque optaram por incluir certos elementos da música brasileira em seus trabalhos. E não vou limitar isso à elementos música popular brasileira, especialmente samba, mas também à temática e ao idioma.
Exemplo clássico dessa “imposição” é o boom que houve de bandas cantando em português após a estouro da fase “Bloco do Eu Sozinho” do Los Hermanos. Depois disso uma quantidade expressiva de bandas passou a cantar em português e a agregar elementos da MPB às canções. Muitas inclusive se tornaram covers patéticos do Los Hermanos (alguém falou Gram?)...
Contudo, acredito que a sonoridade do Los Hermanos foi obtida de um modo mais orgânico, mais natural. Além disso, seus membros realmente parecem conhecer a música popular brasileira. Assim, poucas bandas antes do grupo conseguiram trazer elementos de música genuinamente brasileira para uma estrutura de música pop – a qual foi originalmente concebida por pessoas cantando em inglês - fazendo com que letras cantadas em português não soassem simplesmente idiotas.
Poderia até citar mais exemplos, como a busca frenética por batidas brasucas em músicas eletrônicas ou a inserção de elementos modernosos na nossa bossa nova. Fórmulas as quais, diga-se de passagem, já foram usadas à exaustão. Mas só um exemplo já é suficiente para mostrar o problema.
Assim, acredito que essa postura não se deve somente à busca por uma fórmula de sucesso fácil, apesar desse ser um fator importante (Ludov que o diga...). Acho também que há um certo preconceito contra artistas que simplesmente ignoram - não necessariamente no sentido de desconhecimento, mas sim de não utilização – a música brasileira em prol de um estilo musical diverso. Uma banda de harcore sempre será vista como inferior a um sambista, por exemplo. E um Sepultura inferior a um Lenine.
Mas, o irônico é que esse modo de pensamento é exatamente o oposto daquele vigente em países responsáveis por uma produção de música pop de qualidade. Ninguém nega, por exemplo, a contribuição que os ingleses deram ao blues, através de artistas como Eric Clapton ou John Mayall. E qual a ligação do blues com a Inglaterra? Qual a ligação entre um negro que trabalhava no sul norte-americano com um garoto do subúrbio de Londres? E o mesmo se diga dos Beatles, aficcionados por rhythm and blues americano. Ou mesmo os dinamarqueses e modernos Raveonettes, que emulam, com certa originalidade, canções pop a lá Phil Spector na cara dura.
Portanto, acredito sinceramente que esse tipo de preconceito um tanto quanto elitista deveria ser sumariamente banido para que a produção musical fosse avaliada simplesmente pela qualidade, e não por um ufanismo barato que acaba dando um valor indevido a artistas simplesmente medíocres.


DISQUINHOS PREFERIDOS


Cold Roses - Ryan Adams: depois de “Love is Hell”, rejeitado pela gravadora, e da incursão pelo rock puro e direito de “Rock N Roll”, Ryan resolveu voltar às suas raízes alt-country. Apesar dos excessos de um disco duplo, canções como “When Will You Come Back Home” ou “Sweet Illusions” são exemplos perfeitos do melhor que o compositor pode oferecer.

So Young But So Cold: Underground French Music 1977-1983: disquinho interessante para ver que as modernas bandas dançantes não roubaram suas melodias de teclados e batidas somente Gang of Four e New Order.

31.5.05

Não pare na pista!

A moda é o rock dançante. Sem dúvida a onda do momento são as bandinhas que misturam riffs colantes de guitarra com batidas que fazem todos mexerem seus esqueletos em qualquer pista ou festa. Por isso essa enxurrada de grupos (principalmente britânicos) que dissecam New Order e Gang of Four e tiram um som com uma roupagem nova e deixam uma impressão de "peraí, eu já ouvi essa batida antes!".

Na verdade, esse estouro começou lá atrás, com os primórdios do brit-pop, fim dos anos 80 e começo dos 90, com Stone Roses, Happy Mondays e Primal Scream, passando logo em sequência para a aparição do Pulp (que, apesar de ter rodado todo os anos 80, só conseguiu sucesso nos 90), Suede, Blur e Elastica. Todas essa bandas tinham em comum, além de serem inglesas, a mistura de guitarras barulhentas e distorcidas com elementos de dance music e melodias extremamente grudentas (uns mais e outros menos, mas com uma certa uniformidade).

Depois de um certo ostracismo, o rock dançante voltou a tona puxado pela nova leva de bandas indies que surgem como coelhos a cada dia, em consequência do sucesso inicial de Strokes e White Stripes, agora consolidado em Franz Ferdinand e Bloc Party.

E, para seu total deleite, esse blog preparou para você um set-list caprichado para ajudar a tornar suas festinhas mais embaladas, numa mistura de coisas novas e velhas, conhecidas e não tão conhecidas, sem qualquer pretensão:

1. LCD Soundsytem - Daft Punk is playing in my house
2. The Bravery - Honest Mistake
3. Tom Vek - C-C (You Set The Fire in Me)
4. Franz Ferdinand - Take me Out
5. Franz Ferninand - This Fire
6. Bloc Party - Banquet
7. The Killers - Somebody Told Me
8. The Rapture - I Need Your Love
9. The Futureheads - Decent Days and Nights
10. Hot Hot Heat - No, Not Now
11. Hot Hot Heat - Bandages
12. Human League - Don't You Want Me
13. Daft Punk - Technologic
14. Daft Punk - Around The World
15. New Order - Blue Monday
16. New Order - Bizarre Love Triangle
17. Chemical Brothers - Believe
18. New Order - Broken Promise
19. Pulp - Razzamatazz
20. Happy Mondays - Step on
21. Stone Roses - I Wanna Be Adored
22. Blur - Girls & Boys
23. EMF - Unbelievable
24. The Constantines - No Ecstasy
25. Soulwax - E-talking
26. Kigs Of Leon - The Bucket
27. Moloko - Fun For Me
28. Pulp - Disco 2000
29. David Bowie - Let's Dance
30. David Bowie - Modern Love
31. Elastica - Connection
32. Prodigy - Firestarter
33. Wire - Three Girl Rumba
34. Killing Joke - Eighties
35. Blondie - Call me
36. Gang of Four - Natural's Not In It
37. Mylo - Drop The Pressure
38. The Rasmus - In the Shadows
39. Talking Heads - Psycho Killer
Falta muita coisa, eu sei. Tem coisa muito conhecida, eu sei. Mas esse é só um pequeno guia pra tenta ajudar você a fazer uma festinha mais divertida! Enjoy it! (E acrescente mais coisas nos comentários!)

20.5.05

Cadê meu anti-ídolo?!

Conforme comentamos há alguns meses, o Luna acabou. O último show ocorreu, sem muito estardalhaço, em 28 de fevereiro último, no Bowery Ballroom (NY). A banda não comentou muito o assunto, mas, ao que parece, Dean Warehan simplesmente estava de saco cheio.
Que o Luna era uma banda fenomenal, a qual dominava a técnica de criar canções que mantinham um pé no alternativo e outro no mainstream, todo mundo sabe – e, quem não sabe, deve conseguir agora o último disco da banda, “Rendezvous”. Mas, além disso, o Luna fazia parte daquele restrito rol de bandas cuja missão é fazer música. Eles não ligavam para cabelinhos estilosos, declarações bombásticas, casos com supermodelos ou escândalos semanais por abuso de drogas.
Não acho que há nenhum problema grave em associar a imagem com a música. Velvet Undergound, os Sex Pistols e David Bowie são três dos inúmeros exemplos que conseguiram fazer com que o som e a imagem fossem facetas de uma mesma proposta artística. O problema surge quando um grande número de sujeitos acaba firmando-se mais na aparência, algo que, na minha opinião, é típico das bandas dos anos 2000.
Acho que, apesar de termos um bom número de boas bandas, tenho lá minhas dúvidas se essa postura hype não as ajudou a chegar onde chegaram e se isso não acaba atrapalhando uma substancial evolução delas. Não sei se elas seriam capazes de colocar essa imagem em risco em função da música. Os Strokes, para ficar no exemplo mais óbvio, lançaram um “Is This It”, parte 2, com o "Room on Fire".


Dean no último show do Luna


E é exatamente por esse motivo que determinadas bandas, como o Luna, o Mercury Rev ou o Wilco acabam tendo hoje uma importância maior do que tinham na época em que surgiram. Acredito que elas são as poucas que carregam aquela lição ensinada por muitas bandas que explodiram no começo dos anos 90 e que ligavam mais para mudar a história da música pop do que para cabelinhos engomadinhos.
Se pegarmos esses artistas, é fácil de notar que o caminho mais fácil não era o preferido. Nirvana partiu para o pesadíssimo (tematicamente, inclusive) “In Utero” após o palatável “Nevermind”. O R.E.M. optou pelo orquestral “Automatic for the People” após o sucesso de “Out of Time”. E nem é preciso comentar o caminho do Radiohead após o “Ok Computer”, certo?
Talvez o pessoal “novo rock" deva ser apresentado ao hermitão Jandek – aquele maluco que lança disco há 20 anos, fez uma única apresentação ao vivo, não tem fotos nem entrevistas. Sua música pode ser esquisitíssima, mas, ao menos, ele é a prova viva da possibilidade de fazer música sem essa ligação umbilical com uma imagem.

3.5.05

Cadê meu ídolo?

O mundo pop sempre foi feito de indíviduos carismáticos e talentosos com capacidade de cativar milhares de fanáticos por suas letras, vozes, beleza ou até perfomances no palco. São os clássicos caras-de-camiseta, cuja imagem foi estampada no peito, na parede, no caderno, na cueca etc... de várias gerações sedentas por uma figura que lhe guiasse em sua "rebeldia".

A lista é grande. Desde Elvis Presley, Bob Dylan, John Lennon e Paul McCartney, Mick Jagger e Keith Richards, Jim Morrison, Janis Joplin, Jimi Hendrix, Ozzy Osbourne, Robert Plant e Jimmy Page, Syd Barret, David Gilmour e Roger Waters, passando por Bob Marley, Raul Seixas, Sid Vicious e Johnny Rotten, Joe Strummer e Mick Jones, Robert Smith, Morrisey, Renato Russo, Cazuza, Axl Rose até chegar em Kurt Cobain (esquecendo-se, é claro, de vários outros) a garotada e a imprensa se acostumou com um volume intenso e constante de "ídolos de uma geração".

Polêmicas constantes, boatos infundados, milhares de fotos, músicas raras gravadas em shows, discos raros lançados à revelia da banda, histórias escabrosas, músicas de altíssima qualidade e abuso de drogas fizeram parte da biografia de todos os integrantes da lista acima. Talvez esses os grandes motivos para a agremiação de tantos fiéis seguidores, que se mantém e se renovam até os dias de hoje, não importanto o quão velhos ou mortos estão seus ídolos.

Porém uma constatação é óbvia: há onze anos essa lista está parada em Kurt Cobain. Desde que esse gênio maldito estourou seus miolos (ou o que sobrou deles) ninguém, eu disse NINGUÉM, mais conseguiu se estabelecer no imaginário dos fãs desse mundo pop. Vários novos "gênios" de 15 minutos surgiram, a imprensa tentou forjar vários novos ídolos, mas é fato notório que nenhum ser humano conseguiu cativar novamente a idolatria das pessoas como as pessoas aí de cima.

Nem Thom Yorke, nem Gavin Rossdale, nem Eddie Vedder, nem Evan Dando, nem Julian Casablancas, nem Ben Kweller, nem Jack White, nem Pete Doherty, nem Marcelo Camelo conseguiram sustentar a saga de serem ídolos de uma geração por muito tempo. Alguns deles ainda estão por aí no auge do sucesso, mas dificilmente irão entrar pr'aquele tão seleto rol.

Pode-se arriscar dizer que o que ocorre é uma mistura de insuficiência de talento para tal e falta de carisma aliado a uma efemerização da fama e do sucesso, provacada, sem dúvida alguma, pelo avanço do dinamismo da internet. Mas, sem dúvida, há um grande mistério não-resolvido: por que não existem mais ídolos como antigamente?

29.3.05

Mercury Rev - The Secret Migration


Depois de um bom tempo enfurnados em um estúdio caseiro, o Mercury Rev inaugurou o ano pop com o lançamento de “The Secret Migration”, o qual já foi logo elogiadíssimo pela mídia especializada.
Dentre todos esses elogios, um deles me chamou muito a atenção: a comparação que a revista Uncut fez do disco com o clássico do Pink Floyd “The Dark Side of the Moon”. Segundo o jornalista, com o “The Secret Migration” a banda teria criado “seu grande álbum sobre o ciclo-da-vida, seu próprio ‘The Dark Side of the Moon’ – contudo, aquele termina com esperança e luzes”.
Bom, eu tenho uma certa relutância em engolir idéias como “álbuns conceituais”, e não acho que o Dark Side seja o melhor trabalho do Pink Floyd. Acho até que foi ali que a banda começou a decair. Mas esse é outra história. De qualquer modo, em tese, o disco do Pink Floyd teria a proposta de enfrentar as grandes dores da vida moderna, como a ganância, a fugacidade do tempo e, acima de tudo, a loucura.
Não há dúvidas que o disco do Pink Floyd não termina com esperança e luzes: versos como “and you run and you run to catch up with the Sun, but it’s sinking/and racing around to come up behind you again” (“Time”) ou “you shout and no one seems to hear” (“Brain Damage”) deixam bem expostas as feridas que o letrista Roger Waters se propôs a explorar. E, musicalmente, é um disco grandioso, recheado de solos e efeitos tecnológicos avançadíssimos para a época do disco.
O Mercury Rev já foi muito comparado aos seus ancestrais do rock progressivo, graças aos arranjos complexos e o virtuosismo da banda. Contudo, ao contrário de Yes e companhia, o Mercury Rev aprendeu a condensar toda essa grandiosidade em canções pops de 3 ou 4 minutos, muitas delas seguindo as fórmulas clássicas de refrão-verso grudento-solo legal. Mas, apesar dessa fórmula simples, o grupo não abre mão de orquestrações e paredes sonoras ao melhor estilo Phil Spector, que dão ao grupo um som que vai do alt-country à psicodelia barroca dos Zombies.




E logo na temática do álbum já vejo uma certa diferença entre os dois discos. Enquanto o “Dark Side of the Moon” concentra-se na vida urbana para analisar as chagas do homem moderno, “The Secret Migration” parte de várias imagens bucólicas – flores, a chuva capturada pelas folhas, florestas cheias de perigo, o vento do outono – para tratar de assuntos bem mais minimalistas.
Na primeira canção, “Secret for a Song”, a banda une a estética guitarrística dos Pixies a uma linha de baixo serpenteante e um belo arranjo de piano. Apesar da canção começar com imagens de um crepúsculo e de “violetas abrindo suas pálpebras para o Sol”, o vocalista Donahue logo afirma: “I told you where we're goin' girl/We're off for a dark country ride”. Aqui começa o lado negro da Lua citado explicitamente pelo Pink Floyd, mas que fica escondido em imagens inofensivas no álbum da banda americana.
Em “Vermillion” o grupo cria uma certa atmosfera de calma com um piano e mais imagens naturais, antes que tudo deságüe em um empolgante refrão que traz os versos “Ooh I know love sounds impossible/Some words are just so hard to say/And there's times you feel unlockable/An' all you ever want/Is someone to try...to open up...and find a way in”.
Mas a grande estocada do disco está na canção “My Love”. Um belíssimo arranjo de cordas cria o ambiente perfeito para versos sobre estações do ano, conversas pela madrugada e a história de Maria Madalena fugindo para a França com seu filho (?!?). Tudo é tão perfeitamente estruturado que o refrão aparentemente piegas (“I know I left you...alone too much/But I know I need you here...my love/I never thanked you...enough/I could've given you...my love”) conseguem partir o coração de qualquer fã de gangsta rap.
Portanto, ao fim do disco não consigo enxergar luzes. Assim como seus antecessores ingleses, o Mercury Rev fala sobre feridas. Contudo, aqui elas estão em pequenas fraturas escondidas por trás de algo absurdamente lindo.

9.3.05

Rocky Votolato - Suicide Medicine





Ele não é conhecido, ele não é famoso, ele não pertence ao catálogo de nenhuma grande gravadora. Mas ele é foda. Texano de nascimento e agregado ao efervescente mundo musical de Seattle, Rocky Votolato iniciou sua carreira na obscura banda Waxwing, em 1996, um projeto que não proporcionou maiores honrarias. Percebendo a discrepância entre a expressão de suas letras e o som produzido pela banda, Rocky optou por procurar uma nova textura, mais calma e intimista, baseada na bela interação de sua voz, suas letras e o violão. Assim, em 1999, iniciou sua carreira-solo, com um disco que levava apenas seu nome como título, despejando canções que, tempos depois, iriam ser enquadradas naquilo que a imprensa musical classificou como “alt-country” (aliás, que rótulo tosco!).


Nesse terceiro trabalho, Votolato chega ao ápice de seu lirismo, conseguindo reunir um grande acervo de músicas potentes e letras que impressionam pelas imagens e sentimentos expressados, passando da revolta quase panfletária (“Prison is Private Property”) a uma tristeza e melancolia que chegam a dar dó (“Alabaster” e “Automatic Riffle”). Por trás de suas composições e de seu voz-e-violão está uma banda de apoio formada por Casey Fobert (do Pedro The Lion), Seth Warren (do Red Stars Theory) e Matt Johnson (do Roadside Monument) e a produção de Chris Walla, que já trabalhou com o Death Cab for Cutie.


Certamente a maior marca de todas as faixas é a força empregada por Votolato na interpretação de suas letras, dando ênfase ao seu belo texto, que traz pérolas como em “Suicide Medicine” (“Oh god I love you / I mean forever / I left my body behind to break the news / looks like it's over / please remember all of the things I never got a chance to say / like you look smashing in your fourth grade picture the one that we hung by the door / in our house that was so beautiful / there in our little home”) e na mais bela canção do disco, “Automatic Rifle” (“The night I turned 25 it was legos on the floor / it seemed like a safe enough game / for a man to play with his daughter / an automatic rifle and a bullet through the window / and the troops are satisfied that justice had been delivered”). Vale observar que Rocky deixa expresso um lirismo violento, repleto de imagens fortes, como em “The Light and The Sound” (“If I have to crack open your skull with my fist/ I´ll let the light and the sound escape”), “Death-Right” (“I´ve seen men wallow in fear/ Inaction acts as a blade across the throat”) e “Prison is Private Property” (“But I´d rather starve than be a whore for an
empty living
”).



É nesse ponto que aparece o grande diferencial de Votolato em relação a seus pares de estilo: sua letra não se baseia apenas no romântico estado de sofrimento amoroso ou de depressão melancólica. Traz também, e de maneira muito forte e recorrente, versos cortantes e agressivos, acenando com cenas e vivências chocantes, num “realismo” (aqui como oposição ao “romantismo”) que destoa do genericamente produzido no gênero. Por isso, talvez, a relutância de Rocky em ser associado a bandas como Dashboard Confessionals e Bright Eyes. Como ditto por ele em entrevista: “Whoever is the big deal, that´s sort of what the smaller artists with na acoustic guitar will be compared to. Four years ago, everyone said I was like Elliot Smith. That´s the easy and lazy thing to do, but that´s always gonna happen and it doesn’t bother me. I don´t care. If people really wanna listen to my record they´ll be able to hear the differences. I just don’t think it´s woth losing any sleep over”.

O que se pode dizer é que o resultado do disco insere Votolato com destaque no grande rol dos artistas do “alt-country” que começam a despontar, como Damien Rice, Damien Jurado, David Gray e Pernice Brothers, ao mesmo tempo em que trás reminiscências de Jeff Buckley e Paul Westenberg, isso sem falar em Nick Drake e todos os folk-men (existe essa expressão?) dos anos 60 e 70. Vá atrás, vale a pena.

28.2.05

A arte das canções miseráveis (parte II)

De uns tempos para cá ouvi falar muito do Bright Eyes. Li em alguma revista que o carinha tinha umas letras estilo Bob Dylan, e que as músicas lembravam um folk bacana. Bom, consegui o novo disco do sujeito, chamado “I’m Wide Awake; It’s Morning” e logo na primeira faixa que escolhi para ouvir (“First Day of My Life”) notei que havia alguma coisa no disco.
Cheguei então à conclusão que o tal do Bright Eyes faz parte daquele rol enorme de bandas melancólicas que se proliferaram depois que o Radiohead lançou o “The Bends”, como Travis, Coldplay, Keane etc. A maior parte delas usa a fórmula segura de melodias grudentas, guitarras pesadas aqui e acolá, pianinhos bonitinhos em arranjos simplistas e letras metidas a tristonhas.
Mas algumas vezes, por mais que você saiba que essas musicas não são obras-primas, elas dizem alguma coisa. Nessa “First Day of my Life”, por exemplo, Conor Oberst, o sujeito por trás do Bright Eyes, lança os versos “I remember the time you drove all night/Just to meet me in the morning/And I thought it was strange, you said everything changed/You felt as if you'd just woke up” acompanhado só por um violãozinho. Dependendo das circunstâncias, essas palavras simplistas são certeiras.
Mas é até fácil entender que o efeito que o Bright Eyes causa, já que trata-se de uma banda séria, que tem fãs como Michael Stipe. Só que nem sempre as palavras certeiras são disparadas por músicos de respeito.
Eu mesmo confesso que sou um fã incondicional de “Complicated”, da Avril Lavigne. Por mais que eu saiba que aquilo deve ter sido criado por um produtor gordo e velho e que todos os instrumentos foram tocados por chatíssimos músicos de estúdio, a música me diz algo. Ela tem uma dinâmica fantástica, saltando do verso para o refrão de um jeito irresistível. A mesma coisa acontece com o refrão de “Happy Ending”. Aquele “You were everything that I wanted/We were meant to be, suppposed to be/But we lost it” é digno de qualquer canção do Radiohead na fase “The Bends”.


Isso me leva a uma conclusão - talvez filosófica demais - que essas musiquinhas tem ação rápida, direta. Elas não dependem de lá muita atividade intelectual. Você não precisa saber apreciar ela, como faz com os versos truncados de um Bob Dylan ou as metáforas herméticas de um Leonard Cohen.
É direto e preciso, como uma boa música pop que torna sua vida mais miserável deve ser.

25.2.05

A arte das canções miseráveis (parte I)

De uns tempos para cá ouvi falar muito do Bright Eyes. Li em alguma revista que o carinha tinha umas letras estilo Bob Dylan, e que as músicas lembravam um folk bacana. Bom, consegui o novo disco do sujeito, chamado “I’m Wide Awake; It’s Morning” e logo na primeira faixa que escolhi para ouvir (“First Day of My Life”) notei que não havia muito conteúdo no disco.
Cheguei então à conclusão que o tal do Bright Eyes faz parte daquele rol enorme de bandas melancólicas que se proliferaram depois que o Radiohead lançou o “The Bends”, como Travis, Coldplay, Keane, Camera Obscura etc. A maior parte delas usa a fórmula segura de melodias grudentas, guitarras pesadas aqui e acolá, pianinhos bonitinhos em arranjos simplistas e letras metidas a tristonhas. Como diria o Homer Simpson, naquele clássico episódio com os Pumpkins e o Sonic Youth, é muito fácil deixar a molecada deprimida...
Posso até estar ficando chato demais, mas acho que a maioria do que essas bandas faz é simplesmente dissolver o que seus antecessores fizeram. Para notar isso é só ouvir o “The Bends” e perceber que o Thom Yorke e seus amigos sabem como fazer uma coisa realmente melancólica e com uma evidente qualidade. As letras não se apegam em imagens simplistas, como fez a “First Day of Life” que citei ali em cima (“I remember the time you drove all night/Just to meet me in the morning/And I thought it was strange, you said everything changed/You felt as if you'd just woke up”), nem em arranjos previsíveis - apesar que, ouvindo hoje o “The Bends”, é difícil notar toda a novidade, já que a influencia do disco já foi bem absorvida.
wilco

Mas, para a reclamação não ficar em conversa de velho, cito aqui um disco de 2004 que é realmente melancólico: “A Ghost is Born”, do Wilco. O disco abre com um pianinho baixíssimo e o sujeito murmurando, a beira da cama de uma mulher chorando, algo sobre ir embora. Quando você espera que isso vá emendar em um refrão grudento, surgem guitarras pesadíssimas capitaneadas pelo líder da banda, Jeff Tweedy e seu novo parceiro Jim O’Rourke (que também toca no Sonic Youth). Daí para o fim, é só barulho e riffs. Mas até mesmo as canções mais pop do disco, como a acústica “Muzzels of Bees”, traz doses de melancolia de qualidade (“And dogs laugh, some say they're barking/I don't think they're mean/Some people get so frightened/Of the fences in between”).
E, para quem quiser conhecer os caras que realmente entendem do assunto, deixo algumas sugestões: “Berlin” do Lou Reed, cheio de violência doméstica e crianças órfãs; “Small Change” do Tom Waits, que cheira à álcool do começo ao fim; “Third/Sister Lovers” do Big Star, carregado de ressentimento; “Songs of Love and Hate” do Leonard Cohen, com suas imagens que vão de uma avalanche soterrando a alma a um Papai-Noel com uma faca de aço inoxidável; e, por fim, o clássico “Blood on the Tracks”, de Bob Dylan, parido dolorosamente após o rompimento de seu casamento.
Divirtam-se.

17.2.05

Bons tempos aqueles da boemia

De volta das férias, o tema para a primeira coluna do ano não poderia ser diferente. Imortalizada na voz de Nelson Gonçalves, a boemia certamente não é apenas uma maneira de vida, é um patrimônio histórico e cultural da música brasileira.

Vivida intensamente nas décadas de 30 a 50, foi a responsável por um sem-número de canções ora chorosas e doloridas ora alegres e contemplativas, que retratavam um mundo de sofrimentos amorosos e festas animadas regadas à cerveja e violão pelas madrugadas dos botecos. É dessa “filosofia de conversa de bar” que saíram grandes mestres e grandes momentos da nossa música popular, que, apesar de completamente esquecidos hoje em dia, merecem sempre ser reverenciados.

Entre os precursores, vale a pena citar:

- Noel Rosa, com seus versos inteligentes e sempre ácidos (“Seu garçom faça o favor de me trazer depressa/ uma boa média que não seja requentada/ um pão bem quente com manteiga a beça/ um guardanapo e um copo d´água bem gelada” – Conversa de Botequim);

- Cartola, com seu inconfundível lirismo sentimental e doído (“Procuro afogar no álcool a sua lembrança/ mas noto que é ridícula a minha vingança/ Vou seguir os conselhos de amigos/ E garanto que não beberei nunca mais/ E com o tempo esta imensa saudade/ Que sinto se esvai” – Peito Vazio);

- Ataulfo Alves, talvez o mais injustiçado de todos, consagrado na voz de Orlando Silva, o “Cantor das Multidões” (“Eu na verdade/ Indiretamente sou culpado/ Da tua infelicidade/ Mas se eu for condenado/ A tua consciência/ Será meu advogado” – Errei, Erramos);

- Lupicínio Rodrigues, considerado o pai da “dor-de-cotovelo” ( “Quem há de dizer / Que quem você está vendo/ Naquela mesa bebendo / É o meu querido amor/ Repare bem que toda vez que ela fala/ Ilumina mais a sala / Do que a luz do refletor/ O cabaret se inflama quando ela dança/ E com a mesma esperança/ Todos lhe põem o olhar/ E eu, o dono/ Aqui no meu abandono/ Espero, louco de sono/ O cabaret terminar” – Quem há de dizer);

Todos tiveram seu apogeu entre as décadas de 30 e 40, mas, invariavelmente, restrito a guetos de apreciadores e praticantes desse estilo de vida. Tempos depois, surge nova leva de boêmios, resgatando os princípios de seus mestres, sempre levando suas canções numa mistura de samba, bolero e tango, enfatizando, ao mesmo tempo, a alegria e a dor de cotovelo inerentes à boemia. Entre os maiores, dá pra destacar:

- Paulo Vanzolini, fantástico sambista e letrista de São Paulo, apreciador da noite e grande estudioso de biologia (o museu de Zootecnia da USP leva o nome dele) – (“Eu não bebo pra esquecer/ bebo pra lembrar/ Bebo e cambaleio e tenho/ você ao meu lado/ É o meu instante de felicidade/ Vou andando na neblina das ruas/ Conversando com você/ Cantigas da perdida felicidade/ Seu perfume se mistura ao cheiro bom da madrugada/ Sua mão nem pesa em meus braços/ Mas seu contato é doce, doce/ E o rumor dos seus passos é música, música pura” - Valsa das Três da Manhã);

- Adoniran Barbosa, de todos, o maior símbolo da boemia paulista, dispensa apresentações (“Com a corda Mi do meu cavaquinho/ fiz uma aliança pra ela/ prova de carinho/ Quantas serenatas eu tive que perder/ pois meu cavaquinho já não pode mais gemer/ Quanto sacrifício eu tive que fazer/ para dar a prova pra ela/ do meu bem querer” – Prova de Carinho)

- Dolores Duran, com suas interpretações dignas de lágrimas, uma das maiores influências de Cazuza (“Eu desconfio/ Que o nosso caso esta na hora de acabar/ Há um adeus em cada gesto/ Em cada olhar/ O que não temos é coragem de falar/ Nós já tivemos a nossa fase/ de carinho apaixonado/ De fazer versos/ de viver sempre abraçados/ Naquela base do só vou se você for” – Fim de caso).

- Nelson Gonçalves, que apesar de não ser compositor, emprestou sua voz magnífica à composições que viraram clássicos (“Tango, meu tango triste/ Tantas vezes aqui nesta calçada/ Choramos juntos/ meu tango triste/ Como rivais disputando a bem amada/ Tango, meu tango triste/ fora de moda, desprezado como eu/ Meu companheiro de boemia/ a noite sobre ti também desceu” – Último Tango).

Não há como negar a beleza dessas letras, a maestria dos arranjos (dá uma procurada na Internet que dá pra ouvir todas elas) e o clima intenso e verdadeiro que cada uma delas passa. Todos esse mestres ainda serviram de influência para outros, como Benito de Paula (“Você me olha desse jeito/ meus direito e defeitos querem se modificar/ Meu pensamento se transforma/ me transporto simplesmente/ penso coisa diferente/ Vejo em você meu amor”), Zeca Pagodinho e Cazuza, isso sem citar toda a geração bossa-nova e diveros outros grandes adeptos da tradição boêmia.

Uma pena que uma fase desse porte da música nacional seja esquecida e pouco reverenciada, talvez por falta de informações, talvez por falta de discos no mercado, talvez por falta de interesse das pessoas em conhecerem nossas raízes. Valeria muito a pena se isso fosse revivida, se tivéssemos uma nova geração de boêmios apaixonados que cantam o amor, a dor e a alegria, num puta clima de amizade e conversa de bar, onde o que importa é cantar, tocar, conversar e tomar uma cerveja.

Por outro lado, para aqueles que se julgam dignos do espírito da boemia, vale o tapa na cara de Paulo Vanzolini, em “Falso Boêmio”:
Talvez então não dissesse/ que bebe pra ver se esquece/ que a madrugada o inspira/ Você fazendo o que faz/ Só mostra que quer cartaz/ Que é um boêmio de mentira/ Porque não é boemia/ Trocar noite pelo dia/ Beber com ar de tristeza/ Ser boêmio é ser diferente/ É viver liricamente/ Padecendo com grandeza

4.2.05

Sim, estamos vivos.

Post relâmpago só pra prometer que, após o Carnaval, o blog retorna. Estamos fazendo um layout novo e tudo mais.
Então, não achem que isso aqui tá abandonado. É que agora temos coisas melhores pra fazer. Mas como as férias terminam logo, teremos muito mais tempo pra escrever nossas belíssimas colunas...