28.4.06

Pearl Jam - novo disco

Esqueça o Eddie Vedder fanfarrão e bonachão dos shows no Brasil. O disco novo do Pearl Jam, a ser lançado oficialmente no próximo dia 02 de maio, faz sangrar o lado panfletário de um vocalista/letrista que se perdeu em lugares comuns e brados anti-belicistas bobos e pueris, que seriam relevados se esse fosse um lançamento do System of a Down.

O novo trabalho, o primeiro fora do selo Epic, cheira mofo mesmo antes de ser lançado, insinuando ser um mero retalho de letras e canções mal aproveitadas no último álbum, "Riot Act", de 2002. O hiato de mais de 3 anos desde o último lançamento é suprimido pela temática das letras, que, em sua grande maioria (7 das 13 músicas) tratam de guerra, Bush, soldados e falta de amor no mundo. O que faz pensar que Vedder escreveu mais de 100 canções na época dos atentados de 11 de setembro e apenas descansou nos últimos anos (aliás, jogue no lixo resenhas como a publicada no site da Rádio "Rock" 89 e do Terra, que dizem que o letrista deixou de lado a temática política das canções no novo disco - confira aqui e aqui).

Abrindo com "Life Wasted", cuja introdução remete inevitavelmente a "Search And Destroy" do Stooges, a hemoptise de alusões ao Iraque, Afeganistão, Irã e Palestina é notável e chata. Já a segunda faixa e single de lançamento, "World Wide Suicide", trás diversas alusões ao tema, como "It's a shame to awake in a world of pain/What does it mean when a war has taken over" e "Medals on a wooden mantle/Next to a handsome face/That the president took for granted/Writing checks that others pay". A panfletagem prossegue em "Marker in the Sand" ("Now you got both sides claiming killing in god's name/But god is nowhere to be found, conveniently"), "Gone" ("No more upset mornings/No more trying evenings/It's the American Dream I am disbelieving") e, ainda, em "Army Reserve" ("She can feel this/War on her face/Stars on her pillow/She's folding in darkness/Begging for slumber"). Nem a bela "Parachutes" escapa da tropega ânsia pacifista de Vedder ("Wish the world could go again with love/One can't seem to have enough")

O discurso embolorado ainda dá lugar a uma canção "homenagem" ao proletariado (!!!), bem à moda Bruce Sprigsteen, em Unemployable ("Well his wife and kids' asleep but he's still awake/On his brain weighs the curse of thirty bills unpaid"), que também faz lembrar o andamento de diversas músicas do último disco.

Mas, em meio à enxurrada política do vocalista, duas belas canções conseguem emergir e se destacar pela singeleza das harmonias e sutileza poética das letras. É o caso de Come Back ("Every night I'm waiting for/The real possibility that I may meet you in my dreams/Sometimes you're there and you're talking back to me/Come the morning I could swear you're next to me") e Inside Job ("Underneath this smile lies everything/All my hopes and anger, pride and shame"), não coincidentemente as duas últimas faixas do disco.

Musicalmente, o disco remete aos discos com pegadas mais "punk-rock", como "Vitalogy", momentos de "No Code" e "Binaural" e às experimentações iniciadas em Riot Act, com exceção das citadas canções finais, melancólicas e dramáticas, numa levada em que Vedder é mestre.

Resta esperar que alguém cutuque o gênio por trás desses discursos tolos e mal-elaborados, para que Vedder interrompa sua "BONOficação" desastrosa e o Pearl Jam não acabe virado uma mistura insossa e desagradável de U2 e Rage Against the Machine.

23.4.06

disquinhos preferidos: Isobel & Mark Lanegan, Ryan Adams e Serge Gainsbourg

ballad of broken seas 29 comic strip

Ballad of the Broken Seas (Mark Lanegan & Isobel Campbell): Numa parceria um tanto quanto imprevisível, Mark Lanegan (ex-Screaming Tree/Queens of the Stone Age) se juntou com Isobel Campbell (ex-Belle and Sebastian) para a gravação de “Ballad of the Broken Seas”. O contraste da voz suave de Isobel e da rouca de Mark proporciona duetos fantásticos, construídos sobre harmonias que remetem ao melhor do blues e folk americano da primeira metade do século XX. O álbum soa como uma versão mais moderna e atormentada de outras duplas, como Nancy Sinatra e Lee Hazelwood ou Jonnhy Cash e June Carter.

Extra: Clique aqui para baixar esse disco!

29 (Ryan Adams): no último disco da tríade lançada em 2005 (os outros foram “Cold Roses” e “Jacksonville City Nights”), Ryan dispensou sua banda de apoio, os Cardinals e gravou canções minimalistas, baseadas em piano e instrumentos acústicos. É o mais irregular dos três discos, mas algumas canções são espetaculares, como a linda “Carolina Rain”, narrativa que acena para a fase mais country do cantor, ou “The Sadness”, com um arranjo com toques de flamenco e letra profundamente ressentida (“The sadness is mine/Its why you're not helping me”)

Comic Strip (Serge Gainsbourg): coletânea de sucessos do mais famoso cantor e compositor francês, o controverso e engraçadíssimo Serge Gainsbourg. Esquecendo a trilha sonora de motel “Je t’aime... Moi non plus”, dá pra perceber em canções como “Bonnie and Clyde”, “Ford Mustang” e “Un poison violent, c’est ça l’amour” a força da influência de Serge em artistas contemporâneos, como Luna (que gravou “Bonnie and Clyde”) ou Portishead (que já sampleou Serge).

14.4.06

O "retorno" d'Os Mutantes

O Pitchfork Music Festival, um festival americano especializado em música independente, anunciou com orgulho um dos dos "deuses da Tropicália": Os Mutantes. Como muitos devem saber, desde que o ex-Talking Heads David Byrne resolveu lançar a coletânea "Everything is Possible", Os Mutantes ganharam um status cult na América. Além de Byrne, o grupo atraiu a atenção de sujeitos como Kurt Cobain e Sean Lennon.
Apesar de ser muito interessante ver como os americanos perceberam a importância d'Os Mutantes - sem dúvidas, um dos grupos mais interessantes e inovadores dos anos 60 - um detalhe parece ter passado desapercebido: Rita Lee não participará dessa reunião. E qualquer pessoa que conheça o grupo sabe que, após a saída de Rita, Os Mutantes se tornaram um chatíssimo grupo de rock progressivo, perdendo o humor que tanto o diferenciou dos demais.
Fica então a dúvida se o "amor" da América pelo grupo dos irmãos Baptista não é simplesmente produto daquele hype que todos conhecemos e que transforma desconhecidos em ídolos do dia para a noite...

11.4.06

disquinhos preferidos: Belle & Sebastian, Band of Horses e Built to Spill

The Life Pursuit - Belle & Sebastian: já bem distantes do minimalismo do começo de carreira, o B&S fez o álbum mais "pra cima" de sua carreira, enchendo-o camadas de vocais, sintetizadores, órgãos e levadas dançantes. Pena que aqui no Brasil, onde temos escoceses mais escoseses que os de Glasgow, ela não é mais cool. Ao menos o resto do mundo pensa totalmente diferente...

Band of Horses - Everything All Time: a música mais linda do ano está na última faixa do primeiro álbum dessa banda de Seattle, que revisita a cartilha nirvanesca ("i know you tried/i know you're cursed/i know your best was still your worst/when hollywood was calling out your name") com os pés fincados no alt-country.

Built to Spill - You In Reverse: praticamente uma instituição do indie rock norte americano, o Built to Spill gravou seu álbum mais "acesível" até o momento. Basta ouvir "Going Against Your Mind" ou "Liar", essa a segunda música mais bonita do ano.

5.4.06

Arte bruta

Corro o risco de estar sendo reducionista demais, mas agrupo a grande maioria das bandas “relevantes” de rock hoje em dia em dois bandos. De um lado temos aqueles vestidos de preto e gravatinhas, usando lápis de olho e cantando sobre temas emotivos e totalmente lugar comum. Do outro, os moderninhos despejando rios e rios de cinismo e romantismo amargo. Mas, no meio de tudo isso, surge o Art Brut, um grupo de inglês novíssimo que despontou em 2005 como ótimo “Bang Bang Rock and Roll”,um dos melhores lançamentos do ano passado.
As letras, apesar da aparência estúpida e dos temas fúteis (como paixões platônicas, namoradas e, hmm, “inaptidão sexual”), escondem uma sagacidade e inteligência sem rivais, com letras de uma ironia sem igual desde os Smiths. Logo na abertura o vocalista Eddie Argos usa sua voz rasgada para ofender todo o glamour rocker em “Formed a Band”: “I want to be the boy/The man/Who writes the song/That makes Israel and Palestine/Get along”. E ele continua o tiroteio em “Bang Bang Rock’n’Roll”, logo após ofender os deuses do Velvet Underground: “I don't want a girl that's with the band/I just want a girl that's gonna hold my hand/No more songs about sex, drugs and rock and roll/It's boring!”.


Art Brut


E as canções de amor não deixam por menos. Na melhor faixa do disco, “Emily Kane”, Argos narra a história de um rapaz que, apesar de ter sido chutado por uma namorada há 10 anos, 9 meses, 3 semanas, 4 dias, 6 horas, 13 minutos e 5 segundos, nunca esqueceu a moça. Então, como intuito de encontrá-la, escreve uma canção de rock para que crianças em ônibus escolares cantem o nome da amada por aí. Lindo! A ironia também aparece escondida em “Good Weekend”, na qual um sujeito festeja o fato de ter arrumado uma namorada: “Got myself a brand new girlfriend/So we went to the cinema/We came home from the cinema/We went through the front door/Up the stairs/Through her bedroom door/Onto the bedroom floor/I've seen her naked twice!”.
E todas as letras estão devidamente amparadas por riffs incendiários, baixo e bateria dançantes e os vocais espetaculares de Argos, cuja fúria lembram um Johnny Rotten criado em uma escola de arte inglesa. Enfim, uma banda que, ao contrário da esmagadora maioria, não se resume a um single ou a musiquinhas românticas e cínicas.
É rock inteligente em estado bruto.