23.10.04

Syd Barrett - The Madcap Laughs



1 Terrapin (5:04)
2 No Good Trying (3:26)
3 Love You (2:30)
4 No Man's Land (3:03)
5 Dark Globe (2:02)
6 Here I Go (3:11)
7 Octopus (3:47)
8 Golden Hair (1:59)
9 Long Gone (2:50)
10 She Took a Long Cold Look (1:55)
11 Feel (2:17)
12 If It's in You (2:26)
13 Late Night (3:10)


As risadas do louco. Título sinistro que descreve fielmente o que se passa nesse disco: o deboche do louco em relação à sua própria insanidade, a auto-ironia de um artista que acabou reconhecido mais por seu desequilíbrio mental - ocasionado por consumo excessivo de LSD - do que pela grandiosidade de sua obra. São comuns referências como "o louco que fundou o Pink Floyd" ou "o lesado que, de tanto LSD, virou um vegetal humano". Puro preconceito de quem não se preocupou em analisar a parte musical de sua carreira solo.

Nascido Roger Keith Barrett, Syd integrou a formação original do Pink Floyd, tendo, inclusive, nomeado a banda sob inspiração de dois músicos de blues que apreciava: Pink Anderson e Floyd Council. Em 1967 é lançado " The Piper At The Gates Of Dawn", primeiro disco da banda e uma obra quase autoral de Barrett. As canções chamavam atenção por seu embalo "viajante" e pelo teor das letras, quase sempre sem sentido algum, como em "Astronomy Domine": "Lime and limpid green, a second scene/A fight between the blue you once knew/Floating down, the sound resounds/Around the icy waters underground/Jupiter and Saturn, Oberon, Miranda/And Titania, Neptune, Titan/Stars can frighten".

Esse primeiro disco coincide com o crescimento da cena hippie, onde a mistura de temas esotéricos, música espacial, non-sense e abuso de drogas lisérgicas dominavam a composição das canções, sob o pretexto de criar novas texturas musicais e ampliar os limites do inconsciente.

Porém, Barrett abusou demais no experimentalismo, consumindo excessivamente LSD e Madrax, afetando suas performances em shows, a composição de novas músicas e mesmo o convívio em sociedade. Prova disso foram as várias entrevistas em que o músico ou falava ininterruptamente sobre assuntos desconexos ou se limitava apenas a olhar fixamente para o entrevistador de maneira psicótica, sem nada responder. Também os shows da banda foram ficando cada vez mais prejudicados, com Syd tocando por horas apenas um único e longo acorde, esquecendo-se de cantar e de acompanhar o andamento das músicas.

Essa situação degradante e patética fez com que em março de 1968 o músico se desligasse da banda, permanecendo, teoricamente, apenas como compositor, o que nunca aconteceu de fato. Há algum tempo a banda já contava com outro músico fazendo sua parte nos shows, Dave Gilmour, que foi imediatamente integrado como membro oficial.

A saída do Pink Floyd fez com que Barrett se enfurnasse em seu apartamento, pintando quadros e compondo musicas absurdamente fora dos padrões comerciais da época, com andamento e melodia descompassados, frases totalmente sem sentido e temas inusitados saídos de sua mente comprometida pelo uso continuado e abusivo de drogas lisérgicas.

O resultado dessa fase é "The Madcap Laughs", de 1970, seu primeiro disco solo, fundado num estilo exótico (estrambótico?) e único, com melodias, levadas e letras nunca antes vistas, solos fora de tempo, invertidos, tudo numa linguagem caótica cujo resultado era, impressionantemente, coerente e original. O disco teve parte da produção feita pela dupla Gilmour (que tocou baixo e guitarra) e Waters, do Pink Floyd, e parte pelo produtor da Harvest Records, Malcom Jones.

As seções de gravação foram marcadas pela estranheza dos outros músicos em relação ao estado mental de Barrett, que, de acordo com os próprios, "parecia estar num mundo totalmente a parte do resto das pessoas" , falando coisas sem sentido algum e propondo construções musicais bizarras. O que os deixava mais atônitos é que aquilo que para eles era desprovido de qualquer sentido era algo plenamente razoável e racional para Syd, que insistia em compor daquela maneira, conseguindo prever mentalmente que solos de guitarra aparentemente fora de tempo se encaixariam perfeitamente às canções quando invertidos (!).
Apesar de toda essa insanidade, o disco é marcado em sua maioria por letras de amor, obviamente ao modo Barrett, como em "Terrapin" ("I really love you and I mean you/the star above you, crystal blue/Well, oh baby, my hairs on end about you"), "Love You" ("Oh, you dig it, had to smile just an hour or so/(are) we in love like I think we be?/It Ain't a long rhyme/It took ages to think/I think I'll hurl it in the water, baby") e "Here I Go" ("This is a story 'bout a girl that I knew/she didn't like my songs/and that made me feel blue/she said: "a big band is far better than you"). A mente atabalhoada pelas drogas é revelada em "Octopus" ("Trip to heave and ho, up down, to and fro'/you have no word/trip, trip to a dream dragon/hide your wings in a ghost tower/sails cackling at every plate we break cracked by scattered needles/the little minute gong/coughs and clears his throat/madam you see before you stand") e em "If It’s in You "e sua letra absurda (Did I wink of this, I am/yum, yummy, yum, don't, yummy, yum, yom, yom.../Yes, I'm thinking of this, in steam/skeleton kissed to the steel rail"). Outros destaques são "Golden Hair", poema de James Joyce transformado em algo perturbador por Barrett e "Dark Globe", cuja letra aparenta ser um recado irônico para os ex-parceiros de Pink Floyd e para os antigos fãs da banda ("Won't you miss me?/Wouldn't you miss me at all?").

Porém, as inovações trazidas pela originalidade de Barrett não surtiram efeito de público e de crítica, ao contrário, contribuíram ainda mais para que o músico fosse visto como um louco à margem da sociedade.
A partir dessa obra, Barrett foi se degenerando cada vez mais, tendo gravado apenas mais um álbum ("Barrett") e amargado o estrondoso sucesso que os antigos parceiros do Pink Floyd atingiram com o lançamento de "The Dark Side of the Moon". Nesse disco a banda faz referência explícita ao ex-companheiro em "Brain Damage": "And if the cloud bursts, thunder in your ear/You shout and no one seems to hear/And if the band you’re in starts playing/different tunes/I’ll see you on the dark side of the moon". A banda voltaria homenageá-lo nas canções "Wish You Were Here" e "Shine You On Crazy Diamond".
Syd Barrett se isolou da sociedade, pintando quadros e morando, até hoje, com a mãe, sofrendo de diabetes e de diminuição de sua visão, em um mundo que só a ele pertence. A influência de sua música, porém, ecoa até hoje, desde a gravação de "See Emily Play" por David Bowie, em 1973, até os discos solo de John Frusciante, guitarrista do Red Hot Chili Peppers. No Brasil, a obra de Barrett é a grande influência de bandas como Grenade, Júpiter Maçã e Júpiter Apple.

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