6.12.05

Vamo quebra tudo! Vamo, vamo...

O rock é revolucionário por essência. Não que Lênin e Guevara usassem guitarras, mas a origem do negócio se encontra na quebra da monotonia, na chacoalhada comportamental e estética e no balanço dos esqueletos osteoporéticos do estabelishment cultural (em suma, a porra-louquice em si mesma). Nenhuma novidade, mas parto disso para fazer um paralelo de dois rumos discordantes sustentados por bandas de grande e médio porte no Brasil.



De um lado, pesando 120 kg, 2,15 m de altura e esmagadora carreira de vitórias mercadológicas estão Skank, Jota Quest e Charlie Brown Jr., os grupos de maior vendagem no segmento pop-rock nacional. Em comum, longos anos de estrada, grande número de fãs, execução em massa nas rádios e tv´s e confortável garantia de “lançou-vendeu”.

Apesar das diversas virtudes dessas bandas, principalmente no começo de suas carreiras, o comodismo financeiro e a fórmula do sucesso acabou por transformar o negócio deles num simples Lulu Santos mais pesado, uma espécie de Bon Jovi ou U2 tropical.

O grupo de Rogério Flausino lançou recentemente uma versão de “Além do Horizonte”, um pagode-fake que Roberto Carlos infelizmente sustenta em seu repertório magnífico. A letra fala explicitamente de liberdade e fuga, mas a interpretação da banda mineira sugere no máximo uma patética conversa pós-velório-rumo-ao-enterro.

Falando em fuga, os outros mineiros do Skank assassinaram um dos maiores clássicos de Gilberto Gil para o comercial da Rider. Na visão de Samuel Rosa, “Vamos Fugir” um quase-hino da contracultura tropicalista - que contou com os Wailers em sua versão original - mais parece uma cantiga entoada pelo Missionário RR. Soares, o Edir Macedo da Igreja Internacional da Graça de Deus.

Falando em Deus, o Chorão vai fundar uma religião. Eu tenho certeza disso. Ou vai retomar o Rodox com o “falecido” Rodolfo Raimundos. Não bastasse o verso “Eu descobri que azul é a cor da parede da casa de Deus”, da música “Lugar ao Sol”, de 2001, o auto-intitulado “Marginal Alado” me aparece com “o melhor presente Deus me deu: a vida me ensinou a lutar pelo que é meu”, do disco novo. Não sou ateu, mas, meu amigo, num vá arruma briga com o Padre Marcelo. Se continuar assim, quando o Bento XVI vier pro Brasil, quem cantará a Ave-Maria não vai ser a Fafá de Belém.

No outro lado, com mirrados 54kg, 1.65 de altura e uma carreira sustentada na unha os pesos-pena Cachorro Grande e Bidê ou Balde, dois grandes expoentes das bandas de médio porte. Em comum, 3 discos lançados, terninhos anos 60, o adesivo “rock gaúcho”, a fama de banda engraçadinha-chata e o histórico de shows ensandecidos.

Os dois grupos lançaram discos esse ano pela revista Outracoisa, administrada pelo mito Lobão e os trabalhos trazem algo que remete ao primeiro parágrafo: são verdadeiras homenagens epicuristas à destruição do falso prazer decorrente do comodismo e da bunda-molice. No dialeto de Lobão, constituem real expressão da “pau-durescência” inerente ao rock.

“É preciso dar vazão aos sentimentos!”, título auto-explicativo do mais recente lançamento do Bidê ou Balde é a exortação à necessidade de se mexer. Seja para fazer uma festa, para ir a uma cachoeira, para casar (!) ou apenas para dizer “sim” uma única vez. A faixa que dá nome ao disco trás os versos: “insiste em fazer o que te dá passa na cabeça/ Costuma esquecer o que te decepcionar/ acorda e segue em frente pro que quer que lhe aconteça/ afinal de contas ta na vida pra gozar”. Dá pra notar a tônica da mensagem.

No mesmo sentido, “Pista Livre” do Cachorro Grande expressa o que o “Famílila MTV” pôde mostrar nos últimos dias. Uma banda de amigos, festeira e compromissada com a auto-satisfação. “Nada me impede de fazer o que eu afim” é o que berra Beto Bruno na frenética “Agora eu to bem Loco!”. Os gaúchos mantém, após 3 discos de relativo sucesso, a mesma mensagem “chute aquela porta” do início.

É óbvio que os dois lados são necessários para o andamento do mercado e coisa e tal e sei que a maioria dos leitores não aprecia nem um pouco as “bandas gaúchas”, mas quem se arrisca a discordar que o rock brasileiro esqueceu o eixo Rio-São Paulo pra passear um pouco lá pelos Pampas, aproveitar umas “budegas” e recuperar suas “chalaçadas” e “chinelagens” originais?

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