25.2.05

A arte das canções miseráveis (parte I)

De uns tempos para cá ouvi falar muito do Bright Eyes. Li em alguma revista que o carinha tinha umas letras estilo Bob Dylan, e que as músicas lembravam um folk bacana. Bom, consegui o novo disco do sujeito, chamado “I’m Wide Awake; It’s Morning” e logo na primeira faixa que escolhi para ouvir (“First Day of My Life”) notei que não havia muito conteúdo no disco.
Cheguei então à conclusão que o tal do Bright Eyes faz parte daquele rol enorme de bandas melancólicas que se proliferaram depois que o Radiohead lançou o “The Bends”, como Travis, Coldplay, Keane, Camera Obscura etc. A maior parte delas usa a fórmula segura de melodias grudentas, guitarras pesadas aqui e acolá, pianinhos bonitinhos em arranjos simplistas e letras metidas a tristonhas. Como diria o Homer Simpson, naquele clássico episódio com os Pumpkins e o Sonic Youth, é muito fácil deixar a molecada deprimida...
Posso até estar ficando chato demais, mas acho que a maioria do que essas bandas faz é simplesmente dissolver o que seus antecessores fizeram. Para notar isso é só ouvir o “The Bends” e perceber que o Thom Yorke e seus amigos sabem como fazer uma coisa realmente melancólica e com uma evidente qualidade. As letras não se apegam em imagens simplistas, como fez a “First Day of Life” que citei ali em cima (“I remember the time you drove all night/Just to meet me in the morning/And I thought it was strange, you said everything changed/You felt as if you'd just woke up”), nem em arranjos previsíveis - apesar que, ouvindo hoje o “The Bends”, é difícil notar toda a novidade, já que a influencia do disco já foi bem absorvida.
wilco

Mas, para a reclamação não ficar em conversa de velho, cito aqui um disco de 2004 que é realmente melancólico: “A Ghost is Born”, do Wilco. O disco abre com um pianinho baixíssimo e o sujeito murmurando, a beira da cama de uma mulher chorando, algo sobre ir embora. Quando você espera que isso vá emendar em um refrão grudento, surgem guitarras pesadíssimas capitaneadas pelo líder da banda, Jeff Tweedy e seu novo parceiro Jim O’Rourke (que também toca no Sonic Youth). Daí para o fim, é só barulho e riffs. Mas até mesmo as canções mais pop do disco, como a acústica “Muzzels of Bees”, traz doses de melancolia de qualidade (“And dogs laugh, some say they're barking/I don't think they're mean/Some people get so frightened/Of the fences in between”).
E, para quem quiser conhecer os caras que realmente entendem do assunto, deixo algumas sugestões: “Berlin” do Lou Reed, cheio de violência doméstica e crianças órfãs; “Small Change” do Tom Waits, que cheira à álcool do começo ao fim; “Third/Sister Lovers” do Big Star, carregado de ressentimento; “Songs of Love and Hate” do Leonard Cohen, com suas imagens que vão de uma avalanche soterrando a alma a um Papai-Noel com uma faca de aço inoxidável; e, por fim, o clássico “Blood on the Tracks”, de Bob Dylan, parido dolorosamente após o rompimento de seu casamento.
Divirtam-se.

Nenhum comentário: