29.10.09

500 citações

O queridinho indie na 33ª Mostra Internacional de Cinema de São Paulo é, sem dúvidas, 500 Dias com Ela (500 days of summer, de Marc Webb). É uma comédia romântica do tipo boy-meets-girl estrelada por Joseph Gordon-Levitt (10 coisas que odeio em você) e a bela Zooey Deschanel (que, além de atriz, toca no due She and Him). O filme não teria nada de diferente não fossem as referências: o menino, Tom Hansen, gosta de Smiths, Belle and Sebastian, Edward Hopper, swinging london e cinema francês. A menina, Summer Fin, também. E isso é uma desculpa para que o filme todo seja povoado dessas referências.

O problema é que as citações lançadas a cada 15 segundos sobre o expectador não passam de uma cortina de fumaça: o roteiro do filme é ruim, os diálogos são ruins, os personagens são ruins. Outras comédias românticas como Ligeiramente Grávidos, Simplesmente Amor ou mesmo a série O Diário de Bridget Jones são bem melhores cinematograficamente.
Contudo, na estréia, o público alternativo parece não ter notado que o filme é ruim: a cada citação reconhecida (por mais óbvias que sejam, como um Here Comes Your Man, dos Pixies, ou um poster do Psychocandy), o público vibra: "olha, olha! Jesus!"
Me lembrei então de um dos primeiros filmes indie que bateram no mainstream: Alta Fidelidade, baseado na obra de Nick Hornby. Estavam lá todas as citações óbvias: Belle and Sebastian, Nirvana, The Jesus and Mary Chain. Mas o filme (e o livro) fugia do clichê, com citações de bandas obscuras, clássicos soul e funk. E, mais do que isso: o filme é bom! Alguém que goste de bom cinema pode assistir ao filme e se divertir mesmo sem compreender qualquer das citações. Não é o caso de 500 Dias com Ela.
Talvez isso mostre o que é ser indie hoje em dia: é ter um repertório que, mesmo composto de obviedades colhidas pela internet, dê uma ilusão de superioridade. É saber citar, é saber compreender as citações. Já a esperteza, aquela pontinha de arrogância e, acima de tudo, o humor, são coisas do passado.

21.10.09

Jornada ao passado

Parece que a molecada só conhece bandas surgidas a partir da década de 80. O pós punk de Joy Division, Gang of Four e Sonic Youth é o marco zero. Pioneiros são totalmente ignorados.
Neste sentido, soa genial a atitude de alguns artistas de regravar albuns clássicos inteiros.
Os Flaming Lips prometem gravar o Dark Side of the Moon, do Pink Floyd, todinho. Como devem ter lido na Wikipedia, o Pink Floyd é aquela banda careta dos anos 70, odiada pelos punks. Mas não dá pra ignorar: alguns experimentos do Pink Floyd foram muito influentes. Radiohead que o diga! Enquanto a tal gravação completa não sai, dá pra ouvir uma prévia: o grupo tocou Eclipse, a última faixa do disco, no Morning Becomes Ecletic, da KCRW.
O Beck também está dando sua contribuição através do Record Club. O projeto, que reúne figurões como Nigel Godrich, Devendra Banhart e Binki Shapiro, já regravou o seminal The Velvet Underground and Nico e agora está fazendo o mesmo com The Songs of Leonard Cohen, álbum que deixa as letras (e o nível de depressão) de um Ian Curtis no chão...

9.10.09

Melhor da semana

Para alegrar seu feriadão, um apanhado das melhores dicas que demos nessa semana via Twitter.

MIAMI HORROR - SOMETIMES

Belo vídeo dessa banda australiana conduzida por Benjamin Vanguarde, sujeito que já produziu remixes para os conterrâneos do PNAU e para o Bloc Party. "Sometimes" é o single de trabalho do primeiro disco deles, que ainda será lançado no começo de 2010. Potencial para ser hit indie desse final de 2009.










GIRLS - TRUE LOVE WILL FIND YOU IN THE END


Talvez a banda mais comentada no momento no cenário alternativo, os californianos do Girls mandaram muito bem nessa bonita versão para Daniel Johnston (sim, aquele).











FRANK JORGE - É HORA DE FINGIR (MGMT COVER)

O mito gaúcho manda um cover
em português para "Time to Pretend", do MGMT, em show no Itaú Cultural. Alguns não entenderam a brincadeira, mas enfim... "quero dar um rolê-ê".










BLACK DRAWING CHALKS - MY FAVORITE WAY (AO VIVO)

O hit do momento no underground nacional, entoado pela platéia diretamente do Inferno (SP). Coisa finíssima! Try to hit that little space!




8.10.09

Saudosismo aos 26...

Não faz tanto tempo assim, eu era moleque. Um a mais por aí, como você. Daqueles que reservava uma parte do dia para deitar na cama, colocar o CD no aparelho de som, pegar o encarte e ficar ouvindo e lendo as letras. Sem estar na frente da tela do computador e sem ter quatrocentas e vinte e sete bandas no playlist. Era só aquela. E só aquele CD.

E isso era coisa que se repetia todo santo dia. E com o mesmo CD. Até que aparecesse um aniversário ou um dia especial qualquer e ganhasse mais um punhado de outros. E aquela deliciosa sina continuava.

Sabíamos todas as letras e as versões alternativas delas. Os solos eram decorados e mapeávamos cada barulho estranho que apareciam ao fundo. As do Nirvana eram prato cheio pra isso. Sempre tinha um riff pra aprender a tocar. Havia músicas secretas, aquelas que só quem dormia ouvindo o disco descobria, assustado, depois de pegar no sono. Gravávamos clipes em fitas de vídeo, normalmente de madrugada ou domingo de manhã. Tenho dezessete delas. Ca-ta-lo-ga-das, entendeu?

Idolatrávamos bandas e movimentos com o fanatismo de torcedores de futebol. Quem gostava de Seattle não podia ouvir Guns N’ Roses nem metal-farofa. Não podia, mas ouvia escondido em casa. Os alternativos nem citavam o nome de bandas de grandes corporações. Tiveram que aprender a balbuciá-los depois do “grunge”. Mas ainda assim levantavam grandes discussões sobre a liberdade artística e influência da gravadora na produção dos discos. As ditas independentes de um lado, as “vendidas” de outro.

Os jornalistas fomentavam e informavam essas discussões. Mandávamos cartas ensandecidas pra jornais e revistas. Forastieri, Álvaro e afins... amados no domingo e odiados na segunda. Os textos eram grandes e bem escritos. Muito mais do que este.

Olho pro meu iPod com 80 giga de músicas. O notebook lotado de MP3. O Youtube com todos os clipes que demorei anos pra gravar e milhares de outros que nunca vi. And I just can´t seem to get enough...

Blogs, jornais e revistas falando de cento e quarenta e duas novas salvações do rock por dia, cada um com seu estilo; cada estilo com um nome composto por no mínimo três outros estilos. Não há mais solos fraseados nem riffs matadores. Raro de se ver alguém tocando no violão alguma dessas novas bandas. Salvo pouquíssimas exceções, todas as canções parecem ter vindo do mesmo software, que é responsável pela linha de montagem “Peter Hook/Timbaland”.

E o mais incrível é que não estou comparando meu pai comigo. Falo sobre a mesma geração, a minha geração.

6.10.09

Mecenato

"Não existe almoço grátis", já (dizem que) dizia Milton Friedman. Portanto, esperar que o mercado musical seja grátis nessa era do MP3 e internet e absolutamente utópico se esperarmos um mínimo de profissionalismo dos artistas. Há, claro, diversos artistas que não vivem apenas de música. Mas sabemos que bandas como Beatles, Nirvana e Radiohead não atingiram o ápice com seus líderes dividindo o tempo entre as guitarras e uma chapa de hamburguer. E isso não é novo: desde a antiguidade clássica, as grandes revoluções artísticas aconteceram quando os artistas conseguiam viver de seus próprios ofícios.
Na era da internet, contudo, a fonte mais óbvia de financiamento de artistas, está em xeque: as gravadoras (pequenas ou grandes) lucram cada vez menos e, consequentemente, investem cada vez menos nos artistas. E estes acabam tendo duas opções: ou ficam reclamando dos tempos modernos, como fez a Lily Allen, ou buscam meios alternativos.
E, seguindo a última opção, temos o Public Enemy, um dos grande pioneiros do hip-hop. Através do projeto SellaBand, o grupo abriu a possibilidade para que fãs (ou investidores) doem cotas de, no mínimo, US$ 25,00 para o grupo custear o próximo álbum. Como contrapartida, os doadores terão acesso ao disco, download, extras e parte do lucro das vendas. Ou seja: o grupo passa por cima das gravadoras e vai direto ao público para conseguir financiar o trabalho.
Acho, todavia, duvidoso que esse formato tenha futuro. Muita gente pode se contentar em esperar a gravação do disco e depois baixá-lo. A idéia de lucrar com bandas hoje em dia também não parece lá muito promissora. E talvez apenas bandas com nome sólido - e esse é o caso do Public Enemy - é que podem conseguir levantar fundos suficientes.
De qualquer forma, não deixa de ser mais um sintoma do constante decréscimo do poder das gravadoras.