4.9.06

Bob Dylan, Girl Talk e os tempos modernos

Há alguns poucos anos um produtor que atende pelo nome artístico de Freelance Hellraiser estourou na Internet com “Stroke of a Genie-us”, um inusitado mash-up (espécie de “mistura” entre músicas, criando uma nova canção) dos Strokes com Christina Aguilera. Desde então a moda - que já estava sendo propagada pelo 2Many DJs - pegou e vários outros mash ups foram feitos.

No entanto, passada a novidade, não há como negar que a fórmula é um tanto quanto enjoativa. Algumas vezes é, inclusive, absolutamente angustiante ouvir, por exemplo, John Lennon cantando “A Day in the Life” por cima da harmonia de “Karma Police”, quando você quer ouvir uma ou outra canção se desenvolver.

Contudo, um lançamento recente mudou um pouco as coisas. “Night Ripper”, do Girl Talk, também é uma coleção de mash-ups. No entanto, ao invés de promover o simples encontro entre uns poucos artistas, o jovem de 24 anos por trás do projeto utilizou, no disco, cerca de 200 samples (pedacinhos de música), todos costurados com uma precisão invejável, lembrando mais o belo “Since I Left You”, dos Avalaches, do que qualquer outro mash-up tradicional. Dá pra ficar horas ouvindo as dançantes faixas do disco e procurando citações musicais que vão de Pixies a Nirvana, passando por Black Eye Peas, Pavement, Elton John etc.

Além de tudo, a enorme gama de referências é costurada com uma inteligência ímpar. Basta ouvir a faixa “Peak Out” e constatar um irônico dueto entre “We Want Some Pussy”, do 2 Live Crew, e “Silly Love Songs”, de Paul McCartney.




DJ Gregg Gillis, o sujeito por trás do Girl Talk

Talvez o álbum seja uma das mais evidentes provas de que o pop vive da auto-referência, com o novo surgindo de uma reciclagem do velho e tudo mais. Aí que entra Bob Dylan, mostrando que não é preciso a modernidade de um mash-up para essa óbvia constatação.

Em seu novo disco, ironicamente batizado de “Modern Times”, o compositor revisita a gênese do rock’n’roll, em um disco permeado de blues, rockabilly, toques jazzísticos e seu tradicional folk. E desde o início de sua carreia Bob Dylan sempre deixou claro que a modernidade surge, justamente, dessa visita ao passado e a utilização de suas referências – basta saber que muitas de suas composições são recriações de canções tradicionais.

Fica evidente então, seja com o “tradicionalismo” de um Bob Dylan, seja com os recursos modernos de um Girl Talk, que a música pop não precisa se desvencilhar se seu passado enquanto estiver nas mãos de sujeitos capazes.

BÔNUS:

Faça aqui o download de "Modern Times", o novo disco de Bob Dylan.